segunda-feira, dezembro 28, 2009

Kidzinferno


Está bem que o Natal dá muita caloria, à conta de um despudor gastronómico, mas sempre em lógica de compensações com as actividades que envolve. Viagens entre casas carregados com quantidades no limiar da pornografia de prendas para todos os que nos dizem algo e as crianças sem escola que, parecendo que não, também puxam muito pelo desgaste. Ora se há bilhetes para o zoo, vamos lá tratar de mais uma volta entre os grandes primatas e os felinos e os ursos e as girafas. E aquela promessa há tanto feita, de ir à kidzania, não haverá melhor altura para a cumprir. Vamos lá então a essa dita cidade dos mais novos onde adultos são turistas acidentais e crianças são quem garante o frenesim. A ideia não é nada má não fosse a obrigatoriedade de acompanhar o mais novo e portanto de lá passar horas intermináveis.
A kidzania fica no Dolce Vita Tejo, um imenso shopping, mais ou menos lotado e mais ou menos improvável. É uma cidade onde eles são todas as profissões e onde ganham umas notas parecidas às do monopólio e onde há diversões onde gastam as mesmas notas. Podem ser polícias, bombeiros, médicos, seguranças, caixas de supermercado, funcionários dos correios, jornalistas, pintores das obras, trolhas, trabalhadores da pizza hut e do mac donald's. Podem gastar em escalada, corridas de automóvel, jogos de futebol, pintura artística, salões de jogos, pizzas e hamburguers. São eles a decidir onde ganham e gastam os dinheiros e se ao fim do dia conseguirem 75 kidzes podem abrir uma conta no banco e ganhar um cartão multibanco para levantarem na atm da cidade.
Tudo seria lindo e muito tranquilo, não fosse a cidade sofrer excesso de população. Não há cemitério nem enterros e pela porta de entrada nascem centenas de crianças. Todas tratadas por senhores, donos da sua vontade. Aquilo é obra do Demo ou na melhor das hipóteses de Dante. Medonho de cansativo. Mas a promessa tinha sido feita desde a abertura e portanto o "Quando vamos à kidzania ?" tratava-se de um tema perto do inadiável. Valia pois o imenso penar todas aquelas horas na cidade dos pequenos selvagens.
Espanto e terror, quando à saída descubro um novo tema aberto: "Quando voltamos à kidzania ? É que temos muitos kidzes para levantar com o nosso cartão de débito".
Malditas mentes deturpadas que inventaram tamanho espaço. Quando é que voltam ?
Nuncaaaaaaaaaaaaaaaa

quinta-feira, dezembro 17, 2009

Mais novo

Sirenes. Foi simpático da tua parte convidares a menina para a festa de anos.
Menos simpático foi teres imposto um dress code, sobretudo pela contextualização dada

Leva saias, e collants, para eu te fazer cócegas no pipi????????????

Mais Velho

Claro que não quero saber nada sobre a tua confissão. Se achaste que te devias ir confessar e resolveste ir, é uma questão muito tua e nós não queremos saber o que disseste.
Quantos Pais nossos????? !!!!!
Como? Disseste o quê? Que só lá foste porque assim ganhavas uma balda à aula de história?

quinta-feira, novembro 26, 2009

Cinco

E agora sirenes? Que os anos de vida te ocupam todos os dedos dessa mesma mão que me dás para atravessar a estrada, e que já me escapa se te aventuras nos jardins e nos passeios e nos caminhos secretos desde o lago dos peixes até à escola. E agora sirenes, vais crescer até quanto mais? Até à certeza das palavras lidas por inteiro, até às frases escritas e contas feitas. Bem feitas as contas, vais de partilha em partilha até onde quiseres. Vais acordar de sonos refeitos, cara de desafio e vais cruzar os braços em cada amuo, vais rir, vais sirenar, vais esquiar, vais às cavalitas do caracóis, vais gargalhar, vais continuar a inundar a casa de banho, vais provocar, vais mais longe … Vais ainda adormecer nos meus braços depois do "Vitória vitória acabou-se a história" depois das histórias de princesas, trenós, leões e de cavalos alados. Parabéns meu amor.

sexta-feira, novembro 20, 2009

Terra Firme

Sentou-se no velho pontão. São os dias de inverno que lhe conferem todo aquele exagero de beleza. Galgam-no as ondas em paredes de impaciência natura, a quase neblina filtro de todas as cores do raiar do dia, entre o alvo todos os cinzas até ao negro, as duas colunas de metal ferrugento, lá bem fundo, na mistura da espuma de um mar quase revolto. Advinha-se a tempestade, mais não fora porque os pássaros se aproximam de terra em estridentes guinchos.

Varreu o olhar pelas embarcações ali ancoradas, ao sabor de vagas desencontros em altos e fundos, insistem sempre na tona. Reparou nela. Alheia ao balanço, entregue a cabos, roldanas e velas. Notou-lhe o cuidado nos detalhes, o exame minucioso, tangente ao exagero. Caminhou até lá e deixou-se ali estar a observá-la. Ninguém se entrega assim sem se fazer ao mar. Alheia e concentrada. Quebrou-lhe o foco: "Vais soltar amarras?". O silêncio manteve-se até à certeza naquele cabo. Sem lhe dirigir o olhar, acabou por responder "Pode ser que sim, ainda não sei. Tenho que fazer isto, não vá ter que as soltar." Voz firme, serena, sem candura. Não se lhe dirigiu mais. Apenas se deixou estar enquanto cada peça passava no rigor da observação.

Observou o céu, o mar e sentiu o vento. Conhecia tão bem os sinais. Os pássaros haveriam de por ali ficar mais tempo, que as vagas tendem a não acalmar. Saltou para a embarcação e pegou numa vela. Pareceu-lhe ainda ouvir "Não precisas de fazer isto"… Continuou como se de nada se tratasse. A bonança não viria nunca em ficar ali à espera no cais. Deixaram-se estar a ler os sinais. Expectantes.

quinta-feira, novembro 19, 2009

Gosto

… de farmácias, pela mesma razão que gosto de observar as compras dos outros no supermercado. Cusquice no seu estado mais puro. As pessoas que esperam não conversam muito, o que permite cuscar a conversa daqueles que são atendidos com aqueles que os atendem.

Duas pessoas à minha frente, uma brasileira gorda com uns cabelos imensos, quase até ao rabo. Uns 45 anos, visíveis num rosto carregado. Aviou um Betadine solução ginecológica. Não lhe percebi a história, o que lamento. Seguiu-se a mulher bonita, na casa dos trinta. Enquanto esperava trocou um mundo de mensagens. Pediu um teste de gravidez específico, que a farmácia não tinha. A técnica sugeriu-lhe um outro. "Mas tem tido reclamações?". "Até hoje, não." Tinha parado com a pílula há um mês e estava com seis dias de atraso. Acabou por levar o teste sugerido. Queria muito saber o resultado, mas a urina da manhã é mais concentrada, pelo que só o ia saber na manhã seguinte. Ia ter que aguardar mais 12 horas. A ansiedade dela não parecia jogar muito bem com tamanha espera.

Aposto que, durante a noite, lhe veio o período.

sexta-feira, novembro 13, 2009

A máscara transparente

Fui pela terceira vez àquele local. Pavilhão da gripe da Estefânia. A braços com a febre e a tosse do mais velho, e as dores no peito que confirmaram ser de quadro gripal e de uma ligeira infecção pulmonar. Passam-se sempre demasiadas horas por ali. Entre colheitas, consultas e triagem. Todos de máscara. É um exercício desafiante. Perceber os rostos atrás daquelas máscaras. É lê-los nos olhos, nas sobrancelhas e nas rugas de expressão. É adivinhar-lhes os sorrisos, as dores, os amargos de boca. As máscaras protegem dos vírus, mas não escondem a alma e naquele lugar, em que a razão é uma camada tão fina, não há máscara capaz de esconder tanta angústia.

quinta-feira, novembro 05, 2009

Bochechas

Hoje, entre as tuas prendas de anos, recebeste um desodorizante. Tem a ver com a forma como as tuas hormonas se manifestam quando chegas a casa depois dos treinos de basket. Sinal de que estás a crescer.
Bem sei que te proíbo de crescer mais. Pura brincadeira. É tão bom saber-te a trilhar métricas na equidistância da infância e da adolescência.
Orgulho-me sim, desses teus passos, mas por favor, continua a pedir-me para te contar uma história inventada. Tenho uma nova de animais que fala sobre raposas, pode ser ?
Parabéns meu amor

terça-feira, novembro 03, 2009

Noite das Bruxas

Ele eram dores de cabeça, ele era febre, ele era diarreia e ele era um sem número de colegas em casa de diagnóstico confirmado. Estefânia connosco pois então, apesar de ser Sexta ao final da tarde e da semana ter sido fértil em alarmismo. Após o meu relato na recepção das urgências, a senhora entrega-nos duas máscaras e manda-nos para o pavilhão da gripe A. Cheio, à cunha, a abarrotar a adivinhar tempos de espera irreais. 20 minutos à espera de ser chamado para a triagem, relato repetido, e a confirmação sobre o tempo de espera: código verde e 5 horas até à consulta o que nos atirava para lá da meia noite. Vermelhos e amarelos que entretanto chegassem passariam à frente.

A sala do pavilhão montado há pouco tempo para o efeito quase não tinha vagas. Contentores transformados em banco de urgência para a gripe A, com cartazes a agradecerem ao IKEA e a mais duas ou três empresas que colaboraram na respectiva montagem. Mesmo de olhar descoberto, é difícil perceber o estado de alma por detrás das máscaras brancas. Ainda pensei desenhar uns dentes de vampiro na máscara do loiro de caracóis. Afinal era quase dia das bruxas e sempre se animava aquela gente toda. Está bem que preocupados, está bem que cansados, está bem que quase desesperados.

Entendo mal quem crie mais stress em situações de stress. Um comentário aqui e ali, sobre o inacreditável tempo de espera, sobre os que chegam mais tarde e são atendidos mais cedo, a insinuação de cunhas. Crescendo de desagrado e num repente, num instante uma dezena de insatisfeitos aos berros com o segurança. Meia hora de protestos desmesurados, ao segurança e depois a um médico. E não adiantava a explicação de situações de maior urgência, ninguém ali queria uma explicação racional para os tempos de espera e para os que passam à frente. Só exprimir de formas tanto ou quanto desmesuradas o desagrado por ali estar. Sugerida a utilização do livro de reclamações, os doze protestantes transformaram-se em três reclamantes. Outros abandonaram as urgências antes da consulta. Um colega de escola do Manel, chegado há pouco tempo, acabadinho de sair da triagem, foi chamado para a consulta.

"Aquele acabou de chegar, já vai lá para dentro. Nem a cadeira aqueceu"

Resolvi dizer à senhora que aquele, estava já confirmado desde a ante véspera, que estava com problemas respiratórios sérios e que por isso tinha passado à frente. E que fazia sentido que casos urgentes, fossem tratados enquanto tal. Respondeu-me que a filha também tinha a gripe que lhe diagnosticaram no centro de saúde. Relembrei o problema respiratório e não respondeu mais.

Durante o resto do tempo manteve-se algum frenesim. Lá chamaram o Manel para a consulta, e depois de uma hora, para a colheita. Saímos de lá sete horas depois de ter entrado, e o resultado, só passadas quarenta e oito.

No Sábado, as dores de cabeça, a febre e a diarreia passaram, veio uma tosse. Ligeira e pouco persistente. É tudo o que resta de sintomas de gripe. Isso e o resultado do laboratório. Positivo.

O meu filho é tão esperto que até na gripe tem A.

quinta-feira, outubro 29, 2009

Luz de Presença

O mais velho já tinha tido uma pijama party aqui há uns tempos. Era portanto natural que o do meio reclamasse para si iniciativa semelhante. Era natural também, tendo ele feito anos, juntar os festejos com a dita pijama party. Ora se São Martinho costuma ser destino habitual de fim-de-semana, é com naturalidade que se encara a realização da mesma em tão agradável destino. Se a capacidade das duas viaturas é de oito crianças, e se a da casa é de dez, porque não esgotar o evento? Pois claro. Já agora, ficam uns amigos para convidar e então, toca de juntar mais cinco adultos e sete crianças. Estes último grupo só no Sábado já que a lotação de dormidas esgotou. Falamos portanto de um total de sete adultos e quinze crianças.
Uma vez chegados ao destino, o destino, que prega destas partidas, resolve ditar a inexistência de electricidade. Nada demais caramba. Um telefonema para a EDP e o piquete faria o que tinha a fazer. Uma ida ao agente mais próximo, e uma hora e meia de uma surreal conversa telefónica para a linha de apoio ao cliente da EDP e o resultado mais desejado. Reabastecimento só no dia útil seguinte. A conversa com os vários personagens do Call Center da EDP, dava por si só, direito a um artigo. Não vem a propósito.
Ficou assim eufórico o senhor da loja chinesa com a quantidade de lanternas, pilhas e velas que adquiri naquela tarde. Um balúrdio. Nunca gastei tanto dinheiro no comércio oriental, e não por falta de oportunidade, que já em chinatown andei a comprar relógios armados em bons.
O terreno de São Martinho, a casa na árvore, o slide, as visitas ao cão no fim da estrada de terra batida, digo molhada, digo enlameada, a ida até à baía para jogos de futebol, as estafetas, pareciam garantir o consumo de energia necessário para a tranquilidade a partir das oito da noite. Nada mais errado. Aqueles selvagens têm super poderes e reservas inesgotáveis. A churrascada, as lanternas na cabeça, e as centenas de velas espalhadas, e o tema halloween conferiam uma atmosfera ideal para a brincadeira se prolongar até quase meia noite. Estupores nem vergavam, tampouco cediam. E eis que os adultos de Sábado abandonam o local, arrastando consigo as respectivas sete crianças. Cobardes. Maricas. Traidores. E agora? Oito para dois. Sem luz, os palhaços da EDP não perdem pela demora.
Àquela hora tudo serve para atritos. Quem dorme na parte de cima do beliche, quem dorme no quarto, quem dorme na sala, quem fica com as lanternas, quem dorme com quem. A porcaria das horas também tinham que mudar no fim de semana. "Quem acordar às sete, tem que beber um frasco de atarax e leva com a garrafa na cabeça para perder os sentidos." A ameaça parece funcionar. Só acordaram, todos, às 7:20. A mudança da hora assegurou a existência de luz no exterior.
O pequeno almoço. Inolvidável. Porque o leite é mais quente, porque é mais frio, porque os cerais são diferentes, e as estrelitas têm poucas pontas, porque é mais fiambre, sem manteiga. "Mas quais torradas , meninos ? Vou acender o churrasco para fazer torradas ? Vamos lá a despachar que temos que ir para os cavalos." Festa garantida e só cavaleiros éramos nove. Sete porque dois resolveram não arriscar. Futebol para quem não está em cima do cavalo. "Paiiii. A bola foi parar ali. Podes ir buscar ? Ali, naquele monte de terra … ai não é terra? Cocó de cavalo? Tem graça, daqui parece mesmo terra."
Almoço e mais brincadeira tarde dentro. Muita e intensa. No regresso a Lisboa, baixam guardas e adormecem no carro. Ainda ouvi uma conversa:
- quando morrer vou doar o meu corpo à ciência
- o que é isso ?
- é dar o corpo para eles estudarem
- eu vou ser empalhada e ficar na sala
Distribuídos pelos respectivos pais, o regresso ao mundo electrificado. O importante é que eles se divertiram. E nós também claro.

quinta-feira, outubro 22, 2009

Oito

Claro que tens dias e nos dias tens horas e é assim que te amo. Porque sou de ti nos dias sim e és de mim nos dias não. Com vices com versas.

Parabéns Nhó.

sexta-feira, outubro 16, 2009

Balão

Afinal o menino nunca esteve no balão que viajou quase 100 quilómetros pelos céus de Denver. A porta aberta do cesto foi um mero acaso e a criança estava na garagem de casa. Por ventura no imaginário desta criança os balões não se vestem de prateado, antes de mil e uma cores, e têm a forma de uma bola gigante. Acredito que algumas garagens do lado de lá tenham a magia de alguns sótãos do lado de cá. Cheios de mundos de fantasias onde se pode viajar em balões coloridos guardados por dragões sobrevoando florestas e cenários de aventuras. E se não for de balão, há-de haver viagem com toda a certeza num barco pirata como o que eu comandava no sótão de Tibaldinho. Por causa das arcas velhas de madeira que encerravam tesouros e da varanda, a ponte do meu navio, onde se podiam içar bandeiras e dirigir o leme no meio de tempestades impossíveis. Foi assim que passei a gostar de tempestades e trovoadas, vividas na proa do meu navio, quando lhe rasgavam as velas e ameaçavam o naufrágio. Homens ao mar. Agora o sótão ainda é local previligiado de brincadeiras, e a família de morcegos, que por lá vive, encanta os Marias. Noutras histórias com certeza, noutras fantasias. Se calhar um balão colorido diferente do que a americana criança nunca embarcou.

quinta-feira, outubro 15, 2009

O Brasil SOS ao Brazil

Não tenho nada contra nem a favor da Maitê Proença. Não sou consumidor, admirador da eventual obra, nem tampouco lhe acho muito graça. Não me diverte, não me emociona, não me serve para nada. Anda meio Portugal de honra ofendida porque a senhora resolveu tecer comentários jocosos sobre a inteligência Lusa. Também não me aquece nem arrefece que se indignem, embora ache despropositada a reacção tendo em conta que assistimos de cara alegre a rubricas do estilo "Portugal no seu melhor" onde são constantemente apontados a dedo, casos e mais casos que ilustram a inabilidade de alguns dos nossos conterrâneos.
Este caso não passa de um orgulho que nos falta quando mais precisamos dele e nos sobra quando é perfeitamente acessório. Uma coisa é dizermos mal de nós próprios e sabermos rirmo-nos dos nossos próprios defeitos., Quando alguém resolve fazer o mesmo o caso muda de figura e a nossa honra parece irremediavelmente manchada.
Contudo, nesta onda de indignação, surge uma espuma de tiques xenófobos preocupantes. Sobre os brasileiros em geral, sobre os brasileiros a fazerem piadas com os portugueses, sobre os brasileiros que vivem em Portugal. Conheço alguns, abomino uns quantos, admiro outros mais. Tal e qual como os Portugueses: tantos admiráveis quantos execráveis. Não existe regra e se existisse acreditaria na maioria da excepção. Não tenho paciência para o discurso do povo irmão, nem para a conversa do aqui me sinto em casa, tal como se estivesse no Brasil, tanto mais que a minha avó era de Trás os Montes e eu amo este país. Acontece que esse mesmo Brasil é o país de tantas outras coisas de tantas pessoas que aprendi a admirar e a tomar para referência. Resistamos pois à tentação de tomar partes pelo todo, de olhar só para a porcaria da árvore.
E também caramba, se servir de atenuante, aquela mulher foi namorada do Sássá Mutema e deve ter estado apaixonada pelo Toni Ramos nalgumas 15 novelas. Parecendo que não, essas coisas deixam marcas.

quarta-feira, outubro 14, 2009

Alegria

Segundo o Jornal de Notícias, o bispo da diocese de Leiria e Fátima, quer "peregrinos alegres na visita papal".
Não estranhem portanto se as estradas nacionais e municipais estiverem cheias de peregrinos alegres por alturas de Maio

segunda-feira, outubro 05, 2009

Ei Siiiiilver

Depois de assistir às seis aulas das seis crianças que eu tinha levado e de tentar controlar uma réstia de alergia durante quase duas horas lá chegou a minha vez. Cheguei-me ao cavalo para mais uma aula de volteio e perguntei ao professor se era para subir sozinho para o dorso do animal ou se ele me ajudava. O homem que tinha não sei quantas pessoas à espera só ouviu a palavra sozinho e ficou ali uns segundos com aquela cara de tem-te não caias. Acabou por dizer. Hoje faz a aula sozinho sim senhor. Vai montar a princesa. Ai jesus cristo que aquilo até me soou mal, mas não caí na piada brejeira e fácil. Disse-me como é que se subia para um cavalo com estribos ou lá o que é, ensinou-me como é que se seguram as rédeas, deu-me um espécie de uma vara para a mão "para o pôr a trote" e conduziu-me até ao recinto das aulas. Num repente lá estava eu pela primeira vez em cima da sela, em vez daquelas almofadas das aulas de volteio e de rédeas na mão e a Princesa a passo. "Que raio e agora? Afinal como é que isto trava? Onde é que se acelera ? E para virar, carrega-se onde ? Acudaaaaaam-me". A Princesa estava em modo cavalo automático e andava a passo, atrás dos outros cavalos às voltas naquele rectângulo. Demasiado próxima da cerca para o meu gosto. Volta não volta o estribo roçava nas tábuas e eu estava a ver a minha vida a andar para trás. Quando passava perto dos Marias ouvias frases de incentivo:
"Ganda lata. Nós até temos mais uma aula que ele"
"Já viste a sorte? Eu também quero andar sozinho"
De repente o professor no meio do rectângulo desata aos berros:
"André já te disse para endireitares as costas e colocares os ombros para trás. Tu não ouves o que eu te digo"
Estava eu preparar a minha mais polida resposta, qualquer coisa do estilo "Disse-me mas foi os tomates. Eu nem sei como é que esta merda se trava quero lá saber das costas e dos ombros", quando decido olhar para o pedagogo equestre. Estava de costas para mim a gritar para outro cavaleiro que por um infortúnio também se chama André. Lá continuei no meu modo Cavaco Silva: com as rédeas na mão, sem saber que uso lhes dar e em silêncio absoluto. Foi então que o professor me corrigiu, desta vez era mesmo para mim, porque me chamou Senhor André e disse duas ou três coisas adequadas à minha experiência: "Tem que por as mãos mais para baixo, agarrar as rédeas mais à frente e pode começar a andar a trote."
Fazia sentido porque já tinha três cavaleiros atrás de mim à espera que eu andasse um tudo nada mais depressa, embora eu lhes tenha dito que não fazia a mínima ideia como é que se acelerava.
Mandei uma chibatada no bicho e eis que o estupor desata a trote e aquilo parecia-me já a velocidade da luz, mas com efeitos imediatos no rabo e sabe Deus onde. Volta não volta o professor lá me dava umas indicações até que por fim disse que era para ir passear lá fora até ao portão da quinta e depois ir arrumar a Princesa no picadeiro. Eu e mais outros dois, e mais uma vez acredito que o animal tem piloto automático. Neste passeio estava também o outro André e aproveitei logo para tirar dúvidas sobre pisca-pisca e inversão de marcha. Fiquei a saber que a Princesa tem mau feitio (Confere) e que pode dar coices (Confere), o que me deixou ainda mais descansado ali em cima.
Findo o passeio lá fomos estacionar nas boxes e aprendi a desemparelhar sempre de olho na traseira da dita Princesa. Saí de lá de ego inchado e com a felicidade das crianças. Cheira-me, contudo, que depois disto, e a menos que esteja outra vez uma fila de espera gigante para o volteio, vou voltar para as aulas tipo carrocel à volta do homem. Tomara que não.
Da próxima vez queria montar a Pamela (Panela na versão do António Maria) - é mais elegante e tem melhor feitio que a Princesa.

segunda-feira, setembro 28, 2009

Episodio I, II, III e IV

Episódio 1

- Pai. Porque é que os homens ficam com a pila dura de um momento para o outro.

- Porque a pila tem umas cavidades, uma espécie de casinhas, que se enchem de sangue e isso faz a pila ficar dura

- Está bem. Mas o que é que a faz ficar dura num instante?

- Acontece quando sentem alguma coisa muito boa que lhes dá muito prazer

- Por exemplo, a comer esparguete?

Episódio II

- Pai, as casas de banho das senhoras têm este caixote porquê?

(a razão pela qual eu o levei à casa de banho das senhoras não interessa para nada)

- Para deitarem os papéis aí dentro.

- Os papéis deitam na sanita pai. Não é para deitar os pêssegos?

- Os quantas ?

- Os pêssegos. Aqueles cromos que elas colam no rabinho.

Episódio III

- Ó Manel tu não sabes o que é um OVNI?

- Sei sim é uma nave especial.

Episódio IV

- Pai, sabias que a avó disse que ia votar no Sócrates porque ele era esforçado?

- Não sabia.

- E o avô respondeu que ele era esforçado como o Baltazar.

- Baltazar … Baltazar

- Ó pai. Aquele que era o chefe há muito tempo, e não deixava ninguém discordar com ele.

- Ahhhhhh. Já sei de quem falas. Não era bem Baltazar.

terça-feira, setembro 15, 2009

O GOVERNO É MEO

A bem a bem, deviam inverter o sentido do estado social para o estado poupança reforma. Esta lógica de andar a descontar para benefício de outro foi muito mal engendrada. É muito socialista. Já para não falar dos impostos que anualmente são redistribuídos em rubricas com pouco sentido no orçamento do estado.

Proponho que o próximo governo PSD-PS, ou PSD-CDS-PP, ou PS-CDU, ou PS-BE, ou PS-CDU-BE, ou PS-CDS, ou PS-CDS-PP promova, à semelhança do fazem os operadores de telecomunicações, campanhas de descontos para a segurança social, ou mesmo para o pagamento de impostos, mais de acordo com os tempos modernos. Faziam uns pacotes de descontos/impostos e o contribuinte escolhia em função das sua consciência:

Pacote Saúde- Justiça a 19,99 €

Pacote Saúde - Educação a 17,99 € - para quem dispensa a justiça ou faz justiça pelas próprias mãos

Pacote GOLD: Saúde Educação e Justiça Ilimitada das 21h às 7h – 38,55 €

Pacote Gold com Subscrição da SS 1 (pensão de reforma) , SS2 (baixa por doença) e SS3 (subsídio de desemprego) – 59,99€ *Oferta da Educação Platinum (aulas leccionadas por professores contentes com a reforma educativa) a um dos membros do agregado familiar)

Opção CDS-PP - custo adicional de 49,99 – o dinheiro dos respectivos descontos não é utilizado na interrupção voluntária da gravidez, nem na recuperação de toxicodependentes, nem no rendimento mínimo garantido. * Brinde oferta de um espoliado ou de um ex-combatente do ultramar

Opção BE – custo adicional de 49,99 – o dinheiro é canalizado para subsídio de casamento entre pessoas do mesmo sexo e não será utilizado na defesa nacional, na promoção de eventos de tauromaquia na AR, nem no pagamento de reformas a quadros superiores, administradores e políticos do PS, PSD, CDS-PP * Manuel Alegre não incluído


 

Fica aqui o meu contributo.

segunda-feira, setembro 14, 2009

Nem 8 nem 80

este blogue passou do estado de asfixia democrática ao estado de diarreia verbal. Estou a ver o prós e contras e num repente sou incapaz de fazer a contenção de sólid... de palavras. Vou tomar Imodium

Boatos de Campanha

Então o Sócrates para além daquilo da engenharia, agora queria matar o pai e a mãe para ficar órfão ?

Pára tudo

Na mesma noite ouvi:
1. Manuel Monteiro dizer que estava de acordo com Garcia Pereira
2. Garcia Pereira dizer que a china era social fascista
3. Carmelinda Pereira dizer que se devia proibir os despedimentos
4. Carmelinda Pereira dizer que provavelmente o POUS não vai ganhar as eleições
A RTP, desta vez, conseguiu uma grande alternativa à estreia do Gato Fedorento.

À Cautela

... não tenho escrito grande coisa. É que não quero que a pegada ecológica deste blog seja muito marcante.

sexta-feira, setembro 04, 2009

Isso é que era

... a bem a bem era o Jornal Nacional da TVI ser hoje apresentado pelo José Sócrates. Isso é que era bonito. Notícia de abertura:
"Manuela Moura Guedes retoma carreira artística com versão do hit dos anos 80 - Foram Cardos foram Sócrates"

segunda-feira, agosto 31, 2009

Estremunhado

Gosto da palavra apre. A minha avó Céu usava-a nos apertados limites da educação. Gostava de a ouvir quando ela a dizia irritada.

Apre. Chego sempre estremunhado de férias. Preciso de uns tabefes

sábado, agosto 29, 2009

Tomates

O problema das praia é o excesso de areia. Não gosto daquela matéria que aquece de uma maneira parva e que se enfia em locais de acesso tendencialmente considerado restrito. Nas virilhas e sabe Deus mais onde. A outra chatice da praia é a escassez de sombra, o que em dias de calor é uma merda porque, para se estar relativamente ao fresco, ou nos enfiamos numa sombra alugada a preços mais ou menos pornográficos ou nos sujeitamos a que nos caia uma arriba em cima. Por fim há o sal da água. A água da praia é bestial, e tem aquela agitação das ondas que lhe confere alguma graça, mas escusava de ser tão salgada. É que se a areia vai para as virilhas, o sal vai para as axilas, ombros e costas e um tipo nem dá por ela até à hora de vestir uma t-shirt e aquilo arranha ou faz impressão ou lá o que é, mas é chato.
A praia também tem gente e por vezes em excesso e, a meu ver, quase toda dispensável. Podiam pôr essas pessoas todas dispensáveis a fazer sombra às toleráveis e às imprescindíveis. Em vez disso parece ser um local quase democrático e toda a gente se estende em cima de toalhas e por baixo de chapéus de marcas de automóveis e de bebidas gasosas, ou de palhotas ou toldos. Mais recentemente inventaram uma espécie de iglos que confere alguma sombra mas que me dá a impressão de serem tão quentes que dá para assar leitões lá dentro. Ora toda esta gente com quem se partilha a areia, está sempre cheia de calor o que faz com ingira imensos líquidos, o que consequentemente provoca uma cadência urinária invulgar. E onde é que esta cadência se alivia ? No mar, pois então. É por isso que existem ondas. São uma espécie de autoclismo natural de proporções gigantescas.
Ora a praia dos Tomates tem tudo isto e muito mais o que, em alguns casos, lhe serve de atenuante. A sombra alugada pode incluir espreguiçadeiras com colchões. Existem brasileiros a vender bolas de Berlim, que na praia sabem 132 vezes melhor que em qualquer outro local, os mesmos brasileiros vendem bolachas americanas que eu duvido existirem em qualquer lugar do continente Americano, existem marroquinos que vendem réplicas de relógios de marca, de óculos de sol de marca e de malas de marca, existem outros marroquinos a vender túnicas e vestidos, e chineses que fazem massagens e tatuagens de curta duração. Estes vendedores animam a praia, garantem assunto para muita da conversa e sempre acabam por fazer alguma sombra.
Este ano, e a meio das férias, invertemos horários de praia e passámos a chegar à hora proibida dos raios UV's altíssimos, o que nos poupou a cena do estacionamento, e a sair na altura em que o salva vidas nos puxa o colchão debaixo do rabo porque tem que arrumar os ditos no barraco. Ora neste turno das 14-20, a praia transforma-se em algo muito melhor que a versão 9-13. Quanto mais não seja porque nesta hora as poucas crianças a aturar são as nossas e os filhos de poucos loucos como nós. E porque Lisboa é um bidé e os Tomates um penico, os loucos da frente eram conhecidos e os da frente esquerda conheciam os da frente e também conheciam amigos e amigos de amigos e vai daí, que não demorou dois dias de torra ao sol, já os miúdos todos tinham uma linha de montagem de pulseiras e colares, e acompanhavam os brasileiros, marroquinos e chineses no comércio itinerante entre toldos e barracos. Vai que este tipo de loucura promove o chamado convívio, o que também pode ser genericamente considerado positivo.
O único problema em conhecer várias pessoas ao mesmo tempo é ter que saber os respectivos nomes, mas ao fim de uma semana só houve um ou outro que se me escapou. Nada mau portanto. Muito boas companhias, e tardes bem passadas.
Além da areia não escaldar ao fim da tarde, ganhámos acesso a uma sociedade quase secreta de produção de caipirinha para os toldos ali da zona, servida perto do pôr do sol.
Até pode ter sido do efeito da cachaça, ou do fim da tarde, ou de vizinhanças muito boas ondas, mas este ano, a areia nem parecia querer grandes algazarras com as minhas virilhas.

quarta-feira, agosto 12, 2009

A Galope

Há uns quinze anos atrás, por alturas de um fim de semana de turismo rural, a senhora da recepção recomendou-nos vivamente um passeio a cavalo. Ora perante a total ignorância no manuseamento dos ditos, optámos por um passeio de uma hora de charrete. A coisa envolvia passear pela quinta e arredores e ver uns cromeleques e coisa e tal. Ao fim de um quarto de hora de passeio, vai que desato a fungar e a espirrar. "Malditos fenos, estupor da primavera" pensei. Vai que mais uns minutos, uma coceira nos olhos que não sabia o que fazer e a partir da meia hora de jogo, uns apertos na garganta que mal podia respirar. Finda a viagem, quais cromeleques, qual quinta, qual charrete. Não via nada com os olhos inchados, mal respirava e quase não tinha nariz. Tanto animal que eu não gostava, tinha logo que ser alérgico a cavalos.

Desde então cada vez que me aproximo de um bicho destes, ou ensaio um pequeno passeio, desato em tristes figuras. Casamento incluído que as tias octogenárias comentavam o meu grau de comoção à chegada à quinta, após um passeio de cinco minutos numa viatura equestre: "Ai o seu menino comoveu-se tanto, está com os olhos numa lástima". Ainda há umas semanas atrás num passeio por Sevilha fui feito parvo com uma fralda nas trombas para aguentar meia dúzia de quilómetros, e ainda assim saí antes do fim do trajecto.

E agora na semana passada, como que por milagre de Santa Bárbara (porque se acode nas trovoadas e se todos os cavalos se chamam Trovão, há-se ser esta a santa equestre), fui levar os miúdos a umas aulas de equitação e nem um espirro, nem uma asma, nem uma comichão ocular. Ora eu, que estava deserto para aprender, ainda fiz uma aula de volteio, e dois dias depois uma outra. Os Marias fizeram o mesmo e continuam. Está decidido:

Vamos desfazemo-nos dos peixes e dos aquários, damos um jeito ao escritório e compramos um cavalo lá para casa. Para passear na Alameda. Difícil será ensiná-lo a subir e descer do 3º andar sem elevador, mas assim que aprender pode levar as compras do mês para cima e o lixo para baixo. Aposto que perante esta mais valia até a Ana vai gostar da ideia. A Pipi das Meias Altas também tinha um em casa. Pode pastar na Alameda e vou ensiná-lo a cagar na janela da marquise. Sempre dá razão à vizinha da cave que não paga o condomínio porque os andares de cima lhe estão sempre a sujar o quintal. Ainda não sei que nome lhe hei-de dar. Talvez Mantorras Maria, que lá em casa é tradição o Benfiquismo e os Marias. Mais dois anitos e ainda organizamos corridas de obstáculos no quarto de brinquedos e touradas na cozinha. Com uma vaca em vez de um toiro. Com a quantidade de leite que eles bebem, justifica-se uma vaca na cozinha. Das malhadas pois claro.

terça-feira, julho 28, 2009

João e Maria

Agora eu era um guerreiro de espada na luta contra o dragão, agora era o cavaleiro de Cervantes e via gigantes no lugar dos moinhos, ou era o vento que os fazia agitar os braços, agora eu era capaz de voar até às nuvens e descer na velocidade estonteante, ou era só o pára quedas dos que se saltam de aviões coloridos e precipícios intermináveis, agora eu era capaz de suster a respiração e nadar no fundo dos mares e conhecer-lhe os segredos e criaturas bizarras, ou era escritor inspirado como se não tropeçasse entre as emoções e a folha de papel. Agora conseguia aniquilar todos os bandidos e fazer heróis em todo o mundo, agora não havia medos nem maus e as guerras eram com água e acabavam sempre com lanches cheios de guloseimas e gasosas. Agora eu falava com os golfinhos, com as águias e com as serpentes e era o mais rápido nos cem metros e na maratona, agora marcava golos improváveis e fazia defesas impossíveis, agora brincava no cimo das ondas de todos os metros de altura e conseguia ir e voltar da lua, agora dançava nos teus braços e adormecia a sorrir como crianças felizes.
” Agora eu era o herói e o meu cavalo só falava inglês…”

sexta-feira, julho 10, 2009

Travessa do Calvário

Notou-lhe a presença cada vez que arrumava o carro naquela rua. Já a tarde se fazia noite, e sempre o mesmo quadro, assim como se de um ritual. Do velho carro de compras que arrastava durante o dia, montava abrigo para mais uma noite. As arcadas do prédio e os cartões armados, castelos de cartas de um qualquer jogo de azar, conferiam-lhe débil refúgio e ridícula privacidade para a noite. Não lhe sabe idade, advinha-lhe menos que metade de um século, nunca lha perguntou. Também porque haverá? A higiene possível é feita em gestos escondidos e delicados, como um gato. Por fim solta um imenso cabelo que ainda brilha e já deitada, outros cartões para coberta. Viu-a tantas vezes neste ritual. Nunca lhe dirigiu palavra. Nunca lhe soube o sorriso.
A manhã traz outra luz e se cedo, outros rituais. Os cabelos enrolavam-se de novo e presos em novelo, sustinham-se por mais um dia. Passou por ela quando levava o filho à escola, ali mesmo, na rua de cima. Disse-lhe “bom dia”. Na volta das palavras saiu um bom dia cheio de música e a pergunta ao petiz “Então vais para a escola?”. Escancarou um sorriso. Sincero, dócil, e maltratado. Desde esse dia, eram assim as palavras e os encontros. Nunca menos que um bom dia ou uma boa noite, nunca mais que um sorriso. Sempre a vontade de saber que tropeções a levaram ali, na confortável distância de não se envolver para não cuidar. E se de noite, a chuva caía à bruta, ou o frio gelava os ossos, nunca lhe vinha à ideia a infeliz debaixo das arcadas. Talvez no dia seguinte se perguntasse como havia ela passado a noite, mas nem sequer partilhava com alguém o formigueiro da inquietude.
Por vezes pensava numa ajuda ou numa conversa, nunca lhe parecia oportuno ou adequado. “Se calhar até leva a mal” pensava, como que a desmobilizar qualquer ímpeto de caridade. Ficou-se sempre por ali, a troca afável de um cumprimento e um sorriso. Cómodo não é?

terça-feira, julho 07, 2009

segunda-feira, julho 06, 2009

Confirma-se

A próxima oftalmologista que me espetar uns gatafunhos minúsculos numa longínqua parede e a seguir à minha magnífica prestação, resolver perguntar, "Afinal quantos anos é que você disse que já tinha ?", leva com as lunetas_ridículas_cheias_de_encaixes_para_lentes nos cornos.
Só o não fiz, não resolvesse ela, num acto de insensatez, receitar-me lentes de contacto e eu ter que as por e, de cada vez que o fizesse, à conta dos tremeliques, ficar com a geleia dos olhos espalhada num raio de dois metros.
Não gosto mesmo nada quando se confirma, que está relacionado com a idade.

quinta-feira, julho 02, 2009

Ca nervos

Ora eu não podia ir à festa do loiro dos caracóis, porque à tarde tinha uma reunião do tipo "se me baldo bem me posso queixar de terem decidido o contrário do que eu quero". Posto isto nada mais natural, que para compensar a ausência, levasse comigo o caracóis a assistir à festa matinal do Sirenes. Elas bem me avisaram que estava em vigor uma regra que impedia irmãos de assistir a festas de irmãos, e que a bem a bem, era fazer-me de parvo, despir o bibe ao dos caracóis e roubá-lo para ir assistir à festa do Sirenes. Eu que tenho o QI de um poste telefónico, resolvi ir pedir licença à directora. Desisti quando o diálogo ia no ponto:
"Se o menino for assistir à festa do outro depois não pode entrar na escola durante a tarde"
"Então se não entra na escola à tarde não vai à festa. Levo-o comigo e se decide que ele não pode ir à própria festa depois falamos sobre esse tema."
"Não leva nada o menino"
"Eu tomo conta dele."
"Não leva o menino que foi decidido que não há irmãos a assistir às festas dos irmãos"
"Eu não decidi nada"
"Mas decidiu a escola"
"Não reconheço competências à escola para decidir sobre questões de irmãos"
"Mas é uma questão da escola, portanto decidiu assim e assim será"
Várias litros de ar engolidos em seco para não dizer palavrões e não ultrapassar os limites. Correndo o risco dos caracóis serem impedidos de participar na festa de fecho do ano, resolvi colocar o rabo entre as pernas e falar com o loiro para lhe dar as novas.
Por falar em rabo, e assim num repente aquele lembra-me o Pavilhão Atlântico, a mulher tem o dom de me irritar.

segunda-feira, junho 29, 2009

Alen Tejo e os Quarenta da Maria

E vai que ela fez 40 anos, o que é bom. A quarentena é chata, a quaresma é assim assim, mas a quarentona é bestial. E como fez esse disparate de anos resolveu fazer um piquenique com os amigos. E vai que ela é amiga da Inês, e da Joana, e do Pedro, e da Mercedes, e do Francisco, e da Ana, e da Bárbara, e da Leonor, e da Madalena, e da Rita, e do Gonçalo, e da Sofia, e do Rui, e da Alexandra, e da Bibão, e da Maria, e do João, e do Luís, e a bem a bem era juntá-los a todos numa ilha. E que se há terra que agora tem dado ilhas que é um disparate, é ali a zona do Alqueva. E se no meio da água surgem as ilhas, nas margens surgem os turismos de habitação e os turismos rurais e vai que a moça que já não vai para nova mas está ali que não há isto que se lhe aponte, além de um piquenique, resolve juntar tudo num destes locais paradisíacos. E não contentes com a multiplicação, todos se exponenciam na descendência, Deus os abençoe a quantidade de Marianas e Margaridas que entretinham os coisos Marias, os meus inclusive. E juntar e jantar e jantar e dançar e dançar e beber. E vinhos e vinhos.
E elas, que não são boas de assoar, resolvem pegar-lhe no marido e reinventar o Grease de surpresa com coreografia e figurinos preparados . A pobre, com receio de ir a banhos na piscina, nem lhes notou as vestes exageradas e os cabelos à época. A bem, a bem só deu pela surpresa, já o musical dava de si. E assim foi o fim de semana a festejar quarentonas, que a cá de casa também incrementou um como de costume por estas alturas. Falar em números houve quem andasse a chamar números aos outros como se de signos se tratasse. Tu és um sete, ou tu és um oito, ou tu nem sei bem que raio de número és. Parece haver uma ciência da numerologia e de um a nove algum há-de de ser. Fez-me lembrar a Mara Abrantes mas em versão números “Diga em que dia em que mês você nasceu para ver se o seu signo combina com o seu”. O melhor é estar calado que, se comparada com a Bree já foram Carmos e Trindades, se lhe insinuo Mara Abrantes tenho dias contados. Falar em Carmos e Trindades, não é que há quem ache que o 25 de Abril e o PREC foram exagerados? Quais exagerados ? E eu ali feito camarada, a expor a minha costela de homem de esquerda, não fora a caraça de Hugh Grant… E vinhos? Já falei do vinho? E do grupo de cantares Alentejanos a cantar os parabéns? Tratando-se de versos longos, começaram na sexta à noite e no domingo de manhã já iam no segundo verso. E o vinho ? Já falei do vinho ? Falar em vinho, eu nem sou de cortes e costuras, mas a Mara_Abrantes_de_um_a_nove chegou a estender-se no chão de soca orientada às estrelas, e seja o diabo cego, surdo, mudo e tetraplégico se não chegou a ter a cabeça envolta em panos brancos.
Findo o domingo, ficam histórias, risadas e os Marias a perguntar se podem passar a fazer anos sempre ali. Falar em Marias. Parabéns Maria e que feliz fiquei de festejar-te quarentona.

sexta-feira, junho 26, 2009

Desculpas

Agora quero ver se o Sócrates vem com desculpas esfarrapadas a dizer que não, não fazia ideia que o Michael Jackson ia morrer e tal.

terça-feira, junho 16, 2009

Sonho de Sevilha

O turbilhão das cores transportar-nos àquele mesmo hotel, o estranho homem da recepção estranha a nossa fala, e reservo-nos sem estranheza toda a cidade. Em Sevilha um velho adorna a varanda, sobes a escada que a ladeia, acertas o manto da procissão, para que a virgem adorada, se comova ao passar. Vejo os teus olhos nas cores da praça, e já na arena entre aplausos e olés, dou uma volta de consagração, e na entrada esperas-me no coche que nos mostra a cidade e as cores. A imponente catedral que se giralda de torre em céu, e aos nossos pés tantas paisagens num persistente Maludar, falta-me o ar sobra o calor, e para lá dos quarenta e dois graus, saltamos pelos toldos que sombram estreitas ruas. Lá em baixo o frenesim dos turistas e as mulheres gordas que lhes lêem destinos certos nas palmas das mãos, como na magia. Mágica a ilha em que nos molhamos e como nos molham os risos e gargalhares. Somos todos crianças felizes e nervosas nas descidas em que nos falta o chão. Levam-nos rápidos de volta à muralha e ao calor, jogamos às escondidas nos pátios e puxa-nos o som das cordas, à batida das palmas e ao sapatear. Mulheres de danças sensuais arqueiam o corpo e ainda cores. Sabemos de cor aquele calor e não baixa dos 40 graus. Cerveja gelada e à pressão num esplanada cheia de artistas, fazem em quadros tanta bravura. Fraca figura, que corta em ritual, finas fatias de iguarias despertam nossos paladares. Rendido aos poucos o calor, é outra a luz e outras sombras, candeeiros de ruas, e danço descalço sob o pulverizador. Vence-nos a cidade tórrida da beleza das cores e músicas.

segunda-feira, junho 08, 2009

Eleições

Eu que desta vez fui votar no fecho das urnas, e apesar dos vómitos do sirenes dentro do carro, a abstenção lá de casa foi de zero por cento. Os senhores da mesa bem estranharam o cheiro a vomitado, mas não me impediram de exercer o meu direito.
Esforcei-me portanto e depois apresentam-me estes resultados: "Quatro vitórias e um funeral" Que coisa mais parva. Não havia maneira de perderem todos ? Ou de ganharem todos excepto os irritantes. O que deixa de fora ... 'xa cá ver ... todos. Podemos repetir ? Eu queria votar no Quique Flores e enganei-me.

quarta-feira, junho 03, 2009

Catanos, camandros e caraças

Isto anda confuso, mas a coisa vai ao sítio. Ele é as festas da escola que cada vez que o bochechas tem uma actividade adicional é mais um número com um ou mais zeros à frente e no fim um símbolo que parece um “E” redondo e com um traço suplente. Depois as cadelas que foram de uma creche para outra mas com o desencontro de datas acabaram por pernoitar pelas minhas bandas, Deus nos acuda o que aquelas bichas fazem, que até uma barra de sabão resolveram comer, cheguei mesmo a pensar que o melhor era embalsamar os animais assim com uma pata para cima como se preparassem para atacar, em vez disso quando foram à rua até bolas de sabão sairam. Falar em Deus, o do meio, o loiro de caracóis, comungou pela primeira no Sábado e no Domingo já estava a pedinchar para ir lá novamente que a cena do corpo de Cristo lhe agradou sobremaneira. Falar em Deus a Ana que tinha duas avós, no Domingo passou a ter só uma e vai daí eu que fui fazer a oração dos fiéis na Terça Feira na missa de corpo presente, me enganei no nome da senhora e em vez de pedir pela que estava na caixinha de madeira mesmo ali à frente resolvi pedir pela outra que ainda está de saúde mais ou menos decente. Essa missa de corpo presente das 9 e meia da manhã seguiu-se à missa das famílias das 8 e meia na escola do bochechas que ainda não recebi a respectiva cotação mas não há-de tardar. Já aqui falei da inteligência suprema de casar no dia da criança porque os selvas querem sempre ir a qualquer coisa parecida com uma feira popular e neste ano em particular ainda havia um velório e portanto a segunda-feira foi uma de uma animação ímpar. Já terça, na terapia da fala, o loiro de caracóis ao receber o TPC, depois de ter passado a fase da bauauaica de uís uauande, que consistia em escrever palavras com ‘r’ inicia um diálogo com a terapeuta:
- O Manel lembra-se do trabalho que leva para casa?
- Sim. Escrever palavras com erre?
- Não é bem erre.
- Pois. É com “re”.
- Isso.
- Como caraças.
- Caraças é um bom exemplo.
- E como car....alho.
Peguei nele e fugi dali para fora e agora só lá volta quando o tema for “palavras só com vogais” como ui , ao, ai e au.
A juntar a isto a porcaria da saída da CRIL na segunda circular avançou uns quinhentos metros e o qi dos automobilistas recuou em conformidade pelo que a segunda circular e a radial de Benfica estão sempre uma animação, e como eu também sou um bocado aparvalhado, só me lembro que o melhor é ir pela A5 depois de já não poder sair da fila.
Olha que no meio disto tudo não falei do sirenes. E mais o estupor do sirenes que não se cala e está sempre a pedir água deve estar a caminhar para a diabetes. Tenho dito.

sexta-feira, maio 22, 2009

Oração

Meu Deus faz com que se alguma vez tiver Alzheimer, nunca me esqueça do endereço do youtube

quinta-feira, maio 21, 2009

Submarino ao Fundo

Um décimo do que eu fazia. Saiba eu que fazes um décimo do que fazia na tua idade. A nespereira até lá acima em casa da Avó Céu, ou descer pelos tubos que suportavam a escada de serviço desde o quarto andar até ao rés do chão, ou subir as mesmas escadas sempre pelo lado de fora do corrimão, ou subir as paredes do corredor e passar por cima das portas , ou andar nos telhados dos prédios em frente à Igreja do Bairro, ou entrar em casa pela janela aberta da marquise. Sonhe eu que chegas a estes calcanhares, e falta-me imaginação para a reacção. Não obstante, podes partir-te um bocadinho, mas só mesmo um bocadinho e daqueles que são de rápido remédio. Um dedo vá. A cabeça pronto. Ou o queixo, que eu também parti. Um dente é discutível, só se for daqueles que ainda não são definitivos, ou que o sendo estão sentados nos lugares mais baratos, segundo ou terceiro balcão. Os dentes que estão na plateia VIP não são para partir, definivamente não pode ser. Sobretudo esse, o do meio, em cima, a favola maior. Logo esse que substituiu muito a custo, um outro que, com um ano, resolveste enfiar para dentro numa queda e que portanto andou morto até cair, dando lugar a essa fabulosa favola que agora está … partida ??? Favola partida é uma chatice João Maria, é como partir uma das tuas bochechas. É um cartão de visita. Tu vai-me preparando uma história comovente e heróica, que eu estou capaz de descontar o dinheiro de um pivot na tua mesada … ora fazendo as contas, em 400 semanas o caso fica sanado.

quinta-feira, maio 14, 2009

Não sei se vais lá ...

...
"é que Jesus está vivo, mas também está morto. Metade está vivo e a outra metade está morta"
Nisto desenha uma linha imaginária entre a cabeça e os pés e continua
"... deste lado aqui está vivo, deste lado aqui está morto e nem tem ossos nem nada, é só a alma"
e finge que se desconjunta todo.
Sirenes, hás-de ser considerado apto para a primeira comunhão lá para os trinta e mesmo assim ....

sexta-feira, maio 08, 2009

Direito de Resposta

Hoje, na fila do euromilhões, numa daquelas papelarias de centro comercial apinhada de gente, a senhora da caixa dirige-se alto e bom som para o senhor que folheava a Playboy:
- Ó meu senhor, é proibido consultar a revista. Está aí um cartaz a dizer isso.
Olha que história, uma bancada inteira com a playboy cheia de silicones e o homem ia lá reparar no cartaz. Encolheu-se até onde podia e pousou a revista no seu devido lugar.
Não consegui, mas apeteceu-me tanto, mas tanto dizer bem alto:
- Também não é caso para tamanho chavascal, o senhor só estava a ver as gordas.

quinta-feira, maio 07, 2009

Filhos Legítimos

Estranhei logo quando fui inscrever o primeiro na creche, antes ainda dele nascer. A directora da dita chamou-me Pai, ou pai não interessa. Até fiquei com pena da senhora. Olha teve um deslize e chamou-me pai, deve estar mais atrapalhada que eu, vou fingir que não notei. Afinal não. De há dez anos a esta parte tem sido uma prática corrente, e à medida que o número de filhos aumenta, o número de pessoas que têm a mania de me tratar por pai aumenta também. Auxiliares, cozinheiras, enfermeiros, médicos, educadoras, professoras, lojistas e babysitters tratam-me por pai. Que espero que não por Pai. E logo eu que achava que só tinha rapazes, volvida esta década vejo-me rodeado por uma catrefada de filhos, a maior parte deles do sexo feminino e algumas mais velhas do que eu. E estão mesmo convencidas que são minhas filhas. Legítimas, porque também chamam mãe à minha mulher, e avô e avó ao meu pai e à minha mãe. Ora isto não é um engano, é mesmo uma profunda convicção que são filhos e filhas. Será que contam viver lá em casa? É que o espaço já não é muito e o que eu gasto em cerelac, leite e gromittis nota-se no PIB. Talvez não contem muito com isso porque depois não agem propriamente como filhos. Não nos saltam para o colo quando nos vêem, não aparecem a meio da noite a pedir para se deitarem ali porque tiveram sonhos maus e não reagem nada bem quando lhes tento dar banho. Não querendo tirar partido da situação, eu até os acolho em casa porque a um filho não se vira as costas, mas pelo menos dêem-me direito ao respectivo abono de família. Salvo seja.

quarta-feira, abril 29, 2009

Quotas

- Nesta PlayStation 50 % é tua e os outros 50 %, são 25% meus e 25% do Manel. Certo ?
- E o António ?
- Então 40% teus, e 20% para cada um de nós.
- Nem pensar. Não fico abaixo dos 50%.
- Então 50% teus, 25% meus e 25% do Manel. Damos um comando qualquer ao António e ele acha que está a jogar, nem nota que não está ligado.
- Acabou. Esta Playstation é toda minha. Minto, 50% é da mãe. Comunhão de adquiridos meus caros.
- Diga pai?
- Calem-se e joguem antes que eu me arrependa.

Velho Francisco

Sentou-se no café. Não estava dia que justificasse a rua atravessada e a jogatana com os outros velhos nas mesas do jardim, à beira do coreto. Nem a esplanada, cruzes canhoto. Incomodava-o a impertinência do inverno além das fronteiras de Março. Não era só pela ausência de cor, ou a sensação de frio. Era a inércia convidada para todos os lugares. Os ossos que pareciam mais rijos, as articulações mais teimosas, os amigos que não arriscavam os lances de escadas, até o homem dos jornais que não lhe devolvia as deixas. Homem de poucas conversas nos dias assim. E dos sons do bairro, pouco mais que o agitar das copas das árvores, dos automóveis e passos apressados. Pediu chá e uma torrada. Sabia-lhe bem e a ocasião não lhe pareceu despropositada. Folheou o jornal e deixou-se levar pelo que lia, na sua maioria, ou disparates ou coisas que já sabia pela televisão logo manhã cedo. Envolveu-se de tal forma na leitura que tardou a aperceber-se a luz lá fora parecia mudada. Olhou para lá da rua e era ver os verde a desmultiplicarem-se em múltiplos tons, e as formas a clarificarem contornos. “Traga-me a conta sr Luis, que isto parece querer arrebitar”. Deixou umas moedas na mesa e saiu. Até as pernas pareciam responder de outra forma. Passou pelo quiosque e o homem dos jornais provocou-o para a conversa “Já viu isto? Agora são os porcos que se constipam”. Queria lá ele saber dos porcos, queria era apreciar o jardim, já com o chão recortado de sombras e sol, como peças de puzzle desenhadas nos caminhos, o agitar das árvores abafado pelo frenesim dos miúdos no parque e os sussurros aqui e ali de vizinhas cuscas, o som de passos curtos das empregadas vindas da praça para o almoço das patroas que o senhor engenheiro deve estar para chegar. Atravessou o jardim - até os patos já cá andavam fora - passou o coreto e sentou-se ao sol. A mulher das flores, olhos de vida e sorriso sincero, meteu-se com ele “Boa Tarde Sr Francisco, aposto que é hoje que me compra uma rosa para me oferecer”. Sorriu-lhe de volta.
- Anda lá Francisco, oferece uma rosa à Dona Gracinda. Olha que ela está caidinha por ti
Era o Manuel, antigo companheiro da Sueca.
- Deixa-te de coisas Manuel, e senta-te aí. Cheguei a ver isto mal parado. Os outros ?
– Dá-lhes um tempo, que já não vão para novos ao contrário de nós. Enquanto isso vamos a uma bisca.

segunda-feira, abril 20, 2009

Precisamos de uns novos donos

Além do vazio , a perda de há dois posts atrás, deixou três velhotas numa situação difícil.
Quando o meu sogro adoeceu, as três cadelas que ele tinha, foram para um canil perto da Malveira e neste momento não sabemos que fazer com elas.
A Pipas tem 14 anos e é a mais clarinha de todas. Já não ouve, mas continua cheia de mimos e de vontade de brincar.
A Clara tem 10 anos e é a maior de todas. Não dá grandes confianças no início, mas acaba por ser grande companheira.
A Tata também tem 10 anos, é irmã da Clara, e é a mais gorda e mais gato das três. Gosta de preguiçar e está sempre a pedinchar festas.



Neste momento o que preciso é de qualquer tipo de ajuda para que consiga arranjar-lhes novos donos: sugestões, contactos, divulgação deste post por mail, enfim algo que permita à Pipas, à Clara e à Tata ganhar uma nova vida.

Obbrigado a todos. O mail para onde podem fazer chegar alguma informação ou novidade é o aqui da caixa de costura: afrazao@gmail.com

Chantagista

Ó sirenes, tu vê lá se não te chibas. Passo a explicar. A avó Lídia, na verdade, é bisavó como tu sabes e está muito velhinha e tem momentos de lucidez. E em certas idades há notícias que não devem ser dadas. É discutível eu sei, mas ainda não podes decidir sobre esse tema.
Por outro lado eu sei que tu gostas muito de atenuar a tua condição de terceiro e de ínfimo lá de casa, ganhando corridas aos teus irmãos e sendo o primeiro em determinadas actividades. Mas não posso tolerar chantagens. Não são admitidas chantagens lá em casa. E dizeres, do cimo dos teus quatro anos, nada inocentes
"Ou sou o primeiro a ser servido de panquecas ou vou dizer à avó Lídia que o seu filho já não existe porque morreu" é claramente um caso de chantagem.

terça-feira, abril 14, 2009

Ainda era cedo pá

Já te tinha adivinhado assim no olhar vazio. O que foste tu fazer homem.? Percebeste ao menos que ninguém ali estava para despedidas? Viste-os os olhos perdidos dos teus amigos à espera de explicações no inexplicável? Viste a tua filha entrar na casa vazia, sem perceber a tua ausência, a vasculhar memórias que atenuassem dores. E os teus netos homem? Agora é que eles estão a chegar aquela idade que querias. A idade de os levares às pescarias, de ires com eles de madrugada à lota para o peixe fresco, de os ensinares a cozinhar, e a jogar Poker e Xadrez, de ires com eles às flores para os canteiros de São Martinho. Eles ainda tinham tanto para aprender contigo, homem. Todos tínhamos, mas eles então. Sei que a tua princesa grande já nem estava, mas caramba rapaz, foi também ela quem nos ensinou a lutar sempre até ao fim. Bem sei que estavas refilão, mas nunca te conhecemos doutra forma, e foi assim que aprendi a gostar de ti. E olha que foi gostar que se farta. Deves ter ficado chateado com o que te disse naquela noite em que resolveste que não querias ser internado, mas se soubesse o que sei hoje, tinha dito o dobro ou o triplo até te convencer que não podias ir para casa naquele estado. Desculpa lá a maneira como te falei, mas era-te tão urgente seres internado. Agora não vale a pena dizer-te tudo isto, que a tua mulher deve-te estar a dar uma desanda como já não ouvias há muito. Agora só vale a pena dizer-te que te sentimos tanta falta A falta que os filhos sentem de um pai, que os netos sentem de um avô e que os amigos sentem dos amigos. E sim é mesmo assim, as bochechas do João são iguais às tuas, e no génio do Manel e no gargalhar do António. E deixas-lhes também a doçura deles todos e da rainha lá de casa. A tua filha, heroína nesta história, levou o álbum das fotos lá para perto de ti porque ninguém se queria despedir, só queriam dar-te um abraço e um beijo. Havias de os ver felizes a recordar-te, é que ainda não era altura para despedidas. Ainda não era agora. Ainda era cedo.

terça-feira, abril 07, 2009

Lembro-me

Apego-me a memórias. Tantas vezes nem as sei, quando as cristalizo, tenho-as como se têm memórias e guardo-as como se guardam memórias. Á mão de semear. Não as faço cabides para pendurar as roupas do presente, ou para o ludibriar em alusões ao que já foi, não faço dias em sucessões geométricas. Quando lhes dou a vez, é a pedido dos sentidos. Sempre porque qualquer coisa ou por todas as coisas, os sentidos, as cores, os sabores, os cheiros, os sons. Lembro-me de cheiros quando os revisito sem querer e com eles vêm todos os sentidos. Lembro-me do cheiro da cantina do colégio em forma de castelo, e depois lembro-me das mesas, dos pratos, dos copos, dos azulejos e do elevador. Lembro-me do cheiro do soalho do ginásio e com ele lembro-me da ardósia, das cordas, das argolas, dos boques, dos plintos, e da sensação do peso do corpo sobre as mãos nas paralelas. Lembro-me dos sons, sons ordenados em cinco linhas, canções, e quando me lembro de canções vem tudo ao arrepio com pressa de chegar. Lembro-me do primeiro disco ouvido sem contar lhe contar as vezes, e de o ouvir ao vivo. O homem envergonhado lá ao fundo em cima do palco e a multidão com o dobro do meu tamanho, a voz imensa e a poeira. Lembro-me da poeira que me enchia as mãos e a roupa e do sorriso que me enchia a cara de o ouvir e quase o ver lá ao fundo, e o sono que já tinha. Lembro-me das canções. A memória das canções não é bem como a dos cheiros, ou a dos sabores, ou a das cores. É imensa.

sábado, abril 04, 2009

(des)Construção

"Seus olhos embotados de cimento e tráfego, beijou sua mulher como se fosse lógico, e flutuou no ar como se fosse sábado."
Mais do que a merda que os médicos me dizem sobre ti, é a merda do teu olhar que parece incapaz de dizer algo.

Algo me diz

.... que se desconjuntou tudo outra vez.

quarta-feira, abril 01, 2009

Hiper

As idas ao hipermercado, mesmo em modo toca e foge, são quase sempre animadas. Quanto mais não seja porque gosto de lhes adivinhar a vida só de olhar para os carrinhos ou para os cestos.
Ali na bela vista a população é diversificada e fico com a sensação que até as miúdas desdentadas das caixas ou os seguranças são meninos para me assaltar à saída. Preconceitos de gajo da classe média que resolve fazer compras no hiper às portas de Chelas.
A mulher da fila 36 gritava qualquer coisa ao miúdo que devia andar pelos nove anos. Liguei a super audição.
- Estás aqui está a levar um estalo nas fuças.
Era uma mulher gorda e grande e de ar rude.
- Mas que mania apanhastes tu agora. Levas uma chapadão no focinho. Deslarga-me as mamas.
Voltei a olhar. O miúdo esticava os braços e desatava a dar palmadas às mamas da gorda, como se estivesse a tocar tambor. A mulher limitava-se a ameaçá-lo e a desviar-se das investidas do jovem músico.
- Ó minha senhora mande-lhe com uma das mamas nas trombas que o rapaz perde os sentidos e se não perder a memória nunca mais se atreve.

quinta-feira, março 26, 2009

Provisório

... até que a solução seja encontrada. Raios partam mais o blogger. Teve que ficar suficientemente feio, para eu não me tentar a não mudar. Rabos.

é o browser

... ou lá como isto se chama. Nuns browsers vejo o blog direitinho, nos outros desaparecem as cores de fundo e depois os textos e a caixa de costura parece um monte de ... cócó. Cada vez mais acho que existe uma relação directa entre a minha cabeça e o grau de merdelim com que a caixa de costura aparece.
Vocês também vêem isto tudo mal parido ?

quarta-feira, março 25, 2009

Havias de surpreender

Havias de ser só silêncio e escusar-te às palavras, havias de ter brilhos e maresias ou evidências de ti. Escusa-te a frases desconexas e dá-me a surpresa dos silêncios que enchem salas e ocupam o espaço dos abraços. Havias de ser música de improviso, havias de te dar ao riso, havias de regressar. Havias de ser para lá da teimosia das raízes da árvore, havias de te encher de folhas, havias de te fazer flor, havias de arriscar a Primavera.

domingo, março 22, 2009

Trocadilhos

Colar uma semana à outra, resultados óbvios de uma semana para lá dos limites legais. Um fim de semana quase inexistente, das coisas boas saboreadas às pressas. E uma noite de arromba na Sexta Feira. Concerto do maior poeta zarolho a seguir ao Camões no Maxime. Não fossem estes pequenos intervalos e o mar que daqui se vê tinha pulado o fim de semana. Talvez no próximo o tempo ajude e o relógio também.

quinta-feira, março 19, 2009

Dia do Pai

Tripla pois então. Como um já difere na escola dos outros dois já só devo receber dois lindos cagalhões de barro pintados a guache e envernizados a servirem de pisa papéis.
O mistério da paternidade é que fico estupidamente feliz de os receber, com o acréscimo de mimos que os embrulham. Olhos brilhantes, diz-se ser incondicional. E é.

quarta-feira, março 18, 2009

Murphy

Tanta máquina boa para se avariar que existe naquela cozinha. Inclusive uma assim balofa armada em fina que tem manias de dondoca e que pesa e que tem pás rotativas e que aquece e que usa chapéu de abas, mesmo a pedir uma insuficiência no sistema de turbo_rotação_aquecida. Tanta bimb..., tanta máquina que podia ter-se finado, e tinha logo que ser o cubo da Nespresso a dar de si. Está em coma induzido e só faz café com auxílio à Nespresso da cozinha da vizinha. Parece-me que o sentido da derivada se está a inverter.
Só faltava agora o tempo piorar para o fim de semana, logo neste que ia experimentar os meus novos rolamentos ABEC7 nos patins de passeio. Ou ir a um concerto do José Cid no Maxim's.

terça-feira, março 17, 2009

A subir de mansinho

Foi bonita a festa pá, um sábado de feição a patinar, e o sol no abano até me esqueceo gelo da água como que a querer estalar-me os ossos. A segunda veio como que por bem, e no fim de tarde se fez canção ou artigo de jornal brutal (quem disse que a dor da gente não sai no jornal?) A terça aos tropeções mas sempre de olho nos sabores de casa. Há semanas assim, com sorrisos. Há semanas de derivada positiva. Há sempre coisas bonitas no fundo da minha rua que me esperam.

domingo, março 15, 2009

Pedaço de alma

Não é nada por causa das crianças, é quando as histórias nos arrancam um bocado da alma, que me deixam em agonia. A alma não se consegue regenerar de todos as perdas, de todas as histórias.
Lembro-me de te ter ido buscar a casa dos Geadas para irmos juntos para o Liceu. Já todos sabíamos, e quando a porta entreaberta mos permitiu espreitar, percebemos que o teu pai te estava a contar naquele mesmo instante. A ti e á tua irmã. Foi a primeira vez que senti que a alma nem sempre se regenera. E que grande bocadão nos arrancaram dessa vez. Desde esse dia, se a história me lasca a alma, é como se num repente, as palavras ganhem voz off e fiquem só imagens que me invadem. A imagem das crianças na cresce à espera quwe o pai ou a mãe as vão buscar, no 11 de Setembro. A imagem dos meninos a beber urina durante o assalto à escola primária no Cáucaso em busca de uma sobrvivência terminada à bruta.
E agora , a fechar a passada semeana, este pai de quem nem vi imagem, do filho de meses morto no carro porque dele se esqueceu. De que ar vai este homem encher os pilmões quando alma se lhe foi de uma só vez arrancada à culpa. De dentro da minha cobardia, só me reencontrava com um balázio nos próprios cornos. Algo para além disto será sempre um ganho para o mundo, mas nunca para ele.

quarta-feira, março 11, 2009

terça-feira, março 10, 2009

Twitter Aciedental


Foi a Ana que me falou do Twitter, porque a Catarina... e foi assim com o facebook, e com os blogs, e foi assim com o sexo a três (pronto há aqui umas partes inventadas). Fui espreitar e registei-me no dito cujo e a saber, trata-se de quatro conceitos:
- mensagens mais pequenas que 140 caracteres o que desenvolve uma de duas coisas a capacidade de sintetizar ou a estupidez
- seguidores - pessoas que lêem tudo o que escreves para alguém desse grupo ou que escreves para o mundo
- seguidos - pessoas que escolhes para ler tudo o que escrevem ao mundo ou a alguém que seja seguido por ti
- reenvio de mensagens quando queres divulgar ao conjunto dos teus seguidores algo que leste escrito por alguém que segues
De forma simples o twitter segue o paradigma da imensa matilha: Um conjunto de cães que cheiram os rabos uns dos outros mantendo uma certa ordem em algo que tem tudo para ser um caos.
Depois há uns truques para indicar que se quer ser cheirado só por este ou estes indivíduos da matilha, ou para partilhar com os que cheiram o teu rabo, um cheiro que se cheirou no rabo de outro.
Rabos e cheiros à parte, é simples, engraçado, por vezes útil, por vezes viciante.

domingo, março 08, 2009

8 de Março

A meio caminho de as festejar na importância da minha vida, e a ausência de festa pela necessidade de lhes reservar uma casa do calendário. Não obstante a mais linda das casas.
Para elas vai uma canção de Chico Buarque
Caixa de Música aqui ao lado.

quinta-feira, março 05, 2009

Dúvida

António - Olha pai, a minha pilinha está a crescer. Do que é ?
Eu - eh ... hum ... bem ... é de felicidade António. Normalmente é de felicidade


Existem fundos poupança-acompanhamento-psiquiátrico para os filhos?

Magalhães I

Viva José
Olha rapaz, este post é para te agradecer o facto de teres enviado a Magalhães Maria lá para casa. Depois de três rapazes a vestirem coeiros, finalmente chegou a rapariga. Porque ninguém me convence que, com aquele baby grow em arco-íris que o embrulha, aquela criança não é uma menina.
Mesmo que por infortúnio e falta de discernimento meu, se trate de um rapaz, a Magalhães Maria, é com toda a certeza gay, e até nesse caso, fico à beira da felicidade suprema. Sempre sonhei levar uma filha ao altar para a entregar ao homem que a fará feliz, e a Magalhães Maria é a instanciação desse sonho. Hei-de entregá-la no mais de sorriso nos lábios e a certeza de missão cumprida, e mesmo tratando-se de um gay – intellsexual - o casamento entre pessoas do mesmo sexo mantém acesa a chama da minha felicidade.
Porreiro pá

Magalhães II

- Pai !!! Como é que se desliga esta porcaria ?
- Manel, não fales assim da tua irmã, senão o tio José vem cá e retira-nos a guarda.

segunda-feira, março 02, 2009

Shoping Cultura

O que eu mais gosto nas visitas aos museus, é a parte final quando se vai à loja comprar uma lembrança sobre a exposição. Aliás, se for possível ir à loja, poupando na xaropada da exposição, tanto melhor.
Não obstante, ontem lá fomos à exposição do Darwin, e no fim na loja do museu, comprei uma destas. Cheira-me que a evolução desta minha espécie, tem os dias contados.

Da hora de almoço


saiu-me esta frase:
É importante que no mundo haja quem use tempo para coisas aparentemente inúteis, e no entanto belas.
Veio a propósito do moto contínuo, mas serve(-me) para tantas poesias.

quinta-feira, fevereiro 26, 2009

Ensaio

Agora o que quero é patinar, correr ao acaso na praia quase deserta, rebolar numa encosta, perder-me numa floresta, num livro ou numa canção. Agora quero é os instrumentos da orquestra na minha cabeça, a um compasso certo, no contratempo das tuas palmas. Agora quero o parapente sobre colinas, ou sobre o mar, ou na maré dos teus olhos, agora o estoiro do riso das crianças, e o gosto do teu abraço, e o mundo todo e por inteiro nele. Agora são as águas do meu março, agora quero a promessa de vida no teu coração. Agora quero os filmes mais lindos que houver, e um quadro onde me apeteça entrar e a aguarela infinita.
Agora quero a inatingível escrita, as formas da escultura de Moore e o jazz de Duke, agora quero escrever sem soar a publicidade ao azeite galo, ou à vodafone, agora quero os contornos de nuvens certas no céu.

terça-feira, fevereiro 24, 2009

Caixa Registadora

do Pingo Doce.
Eu - desculpe pode indicar-me em que corredor encontro os cubos Knorr ?
Srª da Caixa - é aqui. Tem que mos pedir a mim quando chegar a sua vez de pagar.
Eu - Aí, na caixa? Sabe de é que eu estou a falar ? Daqueles cubos que existem em vários sabores: carne, de peixe, de galinha.
Srª da Caixa - Precisamente. Tem que mos pedir a mim.
Eu - Caramba quem diria. Os cubos knorr. Que estranho.
Mulher atrás de mim - Sabe porque é ?
Eu - Porque as pessoas roubam.
Mulher atrás de mim - Porque vendem como se fosse haxixe.
Eu - Essa agora. Tiram-nos da prateleira para os clientes não os venderem como droga ? Mas eu agora posso comprar e a seguir ir vendê-los à mesma como se fosse haxixe. O que adianta tirá-los das prateleiras ?
Mulher atrás de mim - mas o senhor tem um ar respeitável
Eu - Essa é uma questão dúbia, mas a verdade é que muitos vendedores de droga têm um ar respeitável. Eu posso muito bem comprar os meus cubos knorr e a seguir ir vendê-los a adolescentes cheios de vontade de fumar umas ganzas.
Mulher atrás de mim - lá isso é verdade
Srª da Caixa - Valha-me Deus. Diga-me quer de que marca ? Pingo Doce ou Knorr ? Galinha, carne, peixe ou marisco ? 8, 16 ou 24 ?
Eu - Uma caixa de 16, galinha, marca Pingo Doce. Espere lá, esses cubos são fumáveis ? Levo 10 caixas de carne e 10 de galinha. Todas as caixas de 24.

Tem o seu quê de nonsense

quase sádico, mas hoje o dia acabou com uma sessão de patinadelas no parque de estacionamento do centro de Alcoitão.

segunda-feira, fevereiro 23, 2009

Associação de ideias

Estava sentada numa mesa à minha frente, virada para mim. Trato gentil, pele cuidada, gestos delicados, quase sensuais, riso franco e sempre contido, contornos suaves. Num repente, pega no garfo, passa-o por baixo da gema do ovo estrelado, levanta a dita gema (já separada da clara) de uma só vez e .... zungas abocanha-a numa só dentada, fazendo-a explodir dentro da boca. Fiquei petrificado, ali a vadiar algures entre as zonas da surpresa e da admiração.
E confesso, que de forma despropositada, sem que nada tivesse a ver, comecei a congeminar uma possível relação entre a capacidade para comer em público a gema de um ovo estrelado de uma só vez e a qualidade do respectivo sexo oral. Bem sei que uma coisa nada tem a ver com outra, mas numa fracção quando vi a gema a desaparecer, cheguei mesmo a pensar ... esqueçam. Que estupidez, tanto mais que depois lembrei-me que já tinha visto outra pessoa a fazer aquilo com o ovo.

sexta-feira, fevereiro 20, 2009

D-1

Sai um abandonador de cigarros ali para a direita. Será que existe um irritómetro ? Amanhã não estou para ninguém !!!

quinta-feira, fevereiro 19, 2009

D-2

Agendei com a minha médica, o abandono de actividades tabágicas no próximo sábado. Preparem-se chavalóides marias, que além do carnaval, este fim de semana há distribuição do chapadão por coisa nenhuma.
Ai se o Benfica não ganha ...

quarta-feira, fevereiro 18, 2009

Oi Elis


Foi na FNAC que me fixei no CD em destaque. "Oi Elis" com o nome Elis quase escrito naquele formato. Canções que sempre ouvi cantadas por ela, uma ou outra numa outra voz, mas a referência sempre ela. Um disco de homenagem a Elis ? Um disco só com canções já cantadas pela Elis ? Que coisa tão frágil, tão cheia de pontos de falha, como é que alguém se sujeita a isto ?
Pus-me à escuta. Canções conhecidas numa sonoridade diferente. Sotaque luso e muito muito Jazz. Arriscou uma versão de "O que tinha de ser". Uma canção que sempre ouvi por Maria Bethânia e que cheguei a duvidar que a Elis pudesse superar. Elis, no fim da interpretação solta um suspiro de alívio. Alívio dela e meu, por ser genial.
Afinal que disco é este ? Quem é esta Susana Travassos ? Escuto-o na diagonal e depois em casa, com mais calma, vejo um ou outro vídeo no you-tube, visito a página oficial e o sítio do MySpace. O disco está longe de ser pretensioso, a voz é excelente, os arranjos magníficos. Esta mulher canta Elis pelo prazer de cantar Elis. Just for the Jazz.
Definitivamente, um disco que vou comprar, pelo gosto de ouvir noutros registos, canções a que me habituei tomar por património emocional. Pelo prazer de escutar, só pelo prazer de escutar. Just for the Jazz.

domingo, fevereiro 15, 2009

Darwin

O tamanho da fila alterou os planos e o passeio deixou de ser ao museu para ser pelos jardins do museu. Cheio de recantos, riachos, esconderijos e aventuras. E também muitos pares de namorados, hetero e homo pois claro, ainda a relembrarem as horas nas filas dos restaurantes da véspera.
Dei por mim a pensar que os pares homossexuais são muito maricas, nem de mãos dadas andam. Vê-se mesmo que estão cheios de vontade de andarem abraçados, ou de braço dado ou do que quer que seja, mas andam a uma distância parva uns dos outros. Que meninas. Não devem ser os mesmos que participam no desfile do orgulho.

sexta-feira, fevereiro 13, 2009

Sexta Treze

O azar desta sexta treze de fevereiro já está definido (ainda me arrependo desta frase quando chegar ao meu carro e não tiver pneus), e reside no facto de amanhã ser dia 14 de Fevereiro. Os centros comerciais parecem decorados como motéis para adolescentes. 'xa cá ver, facebook, livro-das-trombas. Cá está. Grupo de contestação a São Valentim. Aderir.
Já está. "Entupam os restaurantes com reservas para dois e reservem todas as mesas para dia 14." Boa!

quinta-feira, fevereiro 12, 2009

Que chato

Foi logo pela manhã que a ténue coceira dos dias anteriores lhe deu para se agravar.” Já postavas sobre isto”, pensei, enquanto procurava o ralador do queijo, que de repente se tinha transformado na única boa ideia capaz de me livrar de tamanha chatice. Maçada portanto.
Não. O melhor é estar sossegado e não escrever sobre o tema, e até se o conseguir esquecer, tanto melhor. Com sorte nenhum dos atentos e estimados leitores se lembra do incidente da depilação das virilhas e a coisa acaba por passar sem marcas. E o dia até estava a correr bem desse ponto de vista, coração que não vê … A coisa parecia, portanto, estar controlada, até que aquela que até jura por tudo o que lhe é sagradinho ter mais que fazer, me resolve evocar o tema no mural do livro-das-trombas (doravante referido por facebook ). Obrigadinho. E agora onde é que anda o ralador do queijo? Irra.

Summertime

Keith Jarrett
É incrível os sons que o homem faz enquanto toca piano, quase o genial e arrogante tenista no fundo do court. Gosto tanto de Jazz, sobretudo instrumental que não me ralo quando me apercebo da dimensão da minha ignorância.

quarta-feira, fevereiro 11, 2009

Lapsus Linguae

O contexto é a eventual alta do meu sogro, que é razão para preocupação tendo em conta que o homem, além de não ter a mobilidade assegurada, não parece fazer muito sentido quando fala. A seu tempo se vai arranjar uma solução. Vamos falar com o médico e com a assistente social do serviço. Esse mesmo serviço de Santa Marta onde estive internado durante uns dias na 24. As auxiliares, as enfermeiras e o enfermeiro assim meio sabonete reconhecem-me e falam-me com algum entusiasmo (a médica dos olhos bonitos não me ligou pevide – cabra). De repente, quando estão a tratar de algum doente, recordo a forma como me falavam e que dava sempre azo a asneirada. Tratavam-me na segunda pessoa do plural e normalmente na interrogativa:
“Vamos então medir essa tensão ?”
“Vamos fazer umas análises ?”
“Já tomámos o comprimido ?”
Ora eu, raramente falho oportunidades destas e respondia mais ou menos da mesma forma. Vamos sim senhora, vamos ao mesmo tempo, um de cada vez? As senhoras primeiro !
Estas eram as raras alturas em que eu maldizia a minha sorte por não precisar de ajuda no banho, ou da arrastadeira ou mesmo de ajuda para me deslocar até ao cadeirão:
- Vamos ao nosso banhinho?
- Está na hora de fazermos o cócózinho.
- Então e se nos sentássemos um bocadinho no sofá?

terça-feira, fevereiro 10, 2009

Desculpa ????

- Pai, sabias que o D tem guardado no telemóvel o telefone de uma prostituta.
(resposta focado no peixe que não estava a fritar como deve ser)
- Todos temos, meu amor, todos temos.
- Pai ???
- O quêêêêêêêêêêêêêêêê ??? Tem o quê ?
- O telefone de uma prostituta guardado no telemóvel.
- Não tem nada João, deve ser ele a armar-se em parvo.
- Tem sim pai. Copiou do jornal e guardou o número.
- Pronto, pronto ... agora deixa-me aqui tratar do peixe que se está a pegar todo na frigideira.

segunda-feira, fevereiro 09, 2009

Coisas ao acaso

... sobre mim.

O desafio veio de uma mulher que se imagina no Dubai, rodeada de gatos com orelhas furadas e brincos, uma chávena de bom café na mão enquanto, alto e bom som, declama excelente poesia, em roupa interior.

Aqui estão meia dúzia de coisas ao acaso e totalmente desinteressantes sobre mim:
- durmo na fronteira da cama, virado de barriga para baixo num equilíbrio instável. Em alternativa, se decúbito dorsal, levanto um dos braços;
- a coisa mais antiga que me lembro é da ida do homem à lua e depois disso do primeiro dia de escola, que na realidade é (ainda é) um castelo num bairro de Lisboa;
- tenho manias sazonais que duram alguns anos. Os karts, o squash, o hóquei, e acho que ultimamente a aquariofilia parecem ser um exemplo disso. Não sei se gosto mais das actividades se dos acessórios todos que se relacionam com o exercício das mesmas;
- gosto muito de patinar, esta é daquelas actividades que resistiram a todas as outras e já patinei na pista de gelo do Rockfeller Center
- sou Benfiquista dos sete costados mas até aos cinco anos era do Sporting;
- gosto de praticar sofá, sestas, babar-me nas almofadas, adormecer a ver televisão. O bicho sofá exerce um poder hipnótico sobre mim
- os nós das gravatas tendem a sair-me mal, mas há pior. Gosto deles mais gordos do que aquilo que saem
- gosto de cozinhar, mesmo muito e acho que tenho jeito para inventar. Passo por algumas vergonhas: deixo queimar comida de quando em vez e já fiz umas ameijoas com um molho que parecia de bifes
- entusiasmo-me quando me pedem para contar coisas ao calhas sobre mim
O desafio fica obviamente para quem quiser aproveitá-lo, falem ao acaso sobre vocês, afinal o acaso é a origem de tanta coisa importante.

sábado, fevereiro 07, 2009

Exmo Sr

Director de qualquer coisa de Cardiologia de Santa Marta

Era a ver se a 16 ainda está vazia porque os miúdos puxam muito pela taquicardia, além de que já me atingiram umas 14 vezes no hematoma do catetericoiso que se espalhou num raio de alguns 20 centímetros e não há-de tardar muito até ter a pila algures entre o roxo e o verde. Tenho seguido as instruções da médica e colocado as ervilhas congeladas em cima da zona atingida, pelo que já sucedeu algumas vezes o congelamento do órgão, e tenho medo que nalgum movimento mais brusco acabe por se partir, o que seria uma maçada mas que por outro lado pode dar uma carta linda para aquela secção de dúvidas da revista Maria.

Neste contexto e uma vez que ainda não possuem ala de psiquiatria, solicito-lhe que considere a hipótese de readmissão na 16 de cardiologia.

Com os melhores cumprimentos

O paciente

sexta-feira, fevereiro 06, 2009

Canto da Boca

Tão previsível, Sérgio Godinho na caixa de música

Bate Coração

(Como era, vim
como vim, fui
e o que em mim dói
não se vai ver

O que em mim aparece
parece, acho
que não vou deixar
transparecer)

Bate que bate
bate o meu coração
tem razão

Um coração magoado
não cura assim
do pé p´ra mão

Se cura, cura
se não cura é razão
para aflição

Bate, cura, sara
meu coração
Bate que te quero são
o que lá vai, lá vai
olha a dor
que já se esvai
o que lá vai, lá vai
olha a dor
que já se esbate
Bate, bate, bate o meu coração

quinta-feira, fevereiro 05, 2009

Obrigado

Alta




Também os vossos comentos me ajudaram a passar por estes dias.

Dia VI

O da 14 pôs um pacemaker. E ao que parece um ressonamaker também com amplificador. Até o tripé do soro estremece.
A depilação dele está muito fixe. Estilo meio braço, meio peito e meias costas.

Pronto...

... como eu tenho o espírito aberto e percebo a curiosidade.

Esta postagem foi feita no computador do refeitório de cardiologia do hospital em plena hora de pequeno almoço. Nas minhas costas estão uns 30 doentes cardíacos e pelo menos uns 15 pacemakers. As enfermeiras, parecem não ter nãos a medir. Parece que os pacemakers deste lote vinham todos com defeito.

quarta-feira, fevereiro 04, 2009

Dia V

Cartão vermelho no placard por cima da minha cama - indicação de jejum. Logo hoje que me estava a apetecer umas panquecas ao pequeno almoço.
Fui tomar banho e reparo numa barata no meio do corredor. Chamo a atenção do auxiliar:
- Ai não se preocupe que são companhia habitual aqui do serviço.
Eu não me preocupo nada até nem antipatizo com os bichos.
O cateterismo veio umas horas depois, ainda em jejum, e aparato de monitores, fios, contrastes, e um médico que digo-vos, leitoras deste blog, do pouco que já apreendi sobre achar um gajo giro, vocês iam gostar que ele vos cateterizasse todinhas, sem deixar uma artériazinha que fosse por explorar.
Nada, nem uma obtsruçãozinha, tudo flui normalmente e como se quer. Isto é bom porque significa 24 horas até ao abandono do hospital.
Mas antes, e para fecho de festa,tenho que estar assim deitado, com a perna direita esticada e imobilizada. Isto envolve a estreia absoluta nas artes do urinol e da arrastadeira.
Espero que ninguém se lembre de me perguntar se eu preciso de fraldinha para a noite.

terça-feira, fevereiro 03, 2009

Simetria

Enfº - Senhor André, amanhã vai fazer um cateterismo. Não sei se sabe o que é, mas vão enfiar-lhe um tubinho aqui numa artéria da virilha até ela chegar ao coração.
Eu - Sim senhor, a médica já me tinha explicado
Enfº - Pois venho prepará-lo
Eu - E o que é que isso significa ?
Enfº - Tenho que lhe rapar aqui os pelos.
Eu - Queres-me portanto limpar o sebo aos pintelhos. Eu já tenho muito cabelo na cabeça e a gora queres-me dar cabo também dos genitais. É justo
Enf - É só um bocadinho deste lado. Não custa nada.

Nisto começa a depilar-me a virilha direita.

Enfº - Pronto senhor André. Já está !
Eu - Desculpe ???? Já quem ??? Vai-me deixar assim assimétrico. Deve estar a brincar comigo. Agora corta também deste lado. Não quero cá passar vergonhas.
Enfº - Olhe que não é necessário senhor André, basta este lado, que é onde passa a artéria.
Eu - Ai é necessário é, ponha lá isto simétrico que eu tenho uma imagem a defender.
Enfº - Pronto, se o senhor André insiste.

Ficou aqui uma obra de arte. Quando sair daqui compro uma máquina daquelas.

Meu querido filho António: Que nem te passe pela cabeça dizeres qualquer coisa do estilo "Olha o pai também é careca da pila"

Mudanças

Fui transferido. Ninguém me convence que isto não foi obra do meu sogro, num raro momento de lucidez:
- O ressuscitado que saia da minha beira, que o cabrão nem um cafezinho é capaz de me trazer.
Nem foi de modas o estupor do velho, mandou-me para outro edifício. Para cardiologia. Não lhe perdoo.
Agora perdi o fio à meada das camas 19 a 24.
Aqui nesta enfermaria há camas da 13 até à 19 sendo que a 16 é a minha. Mal se vêm arrastadeiras e o da 14 passou a tarde a jogar UNO com a mulher. Tenho cá para mim que o UNO é o jogo mais perigoso, admissível neste serviço. Pode-se jogar ao galo, ao bate-pé e ao UNO. Também se pode pode fazer macramé e renda de bilros. A partir do mikado inclusive, todos os jogos estão proibidos. E mesmo os jogos de futebol, são transmitidos com um atraso de 10 minutos. Caso o Benfica sofra algum golo a emissão é interrompida por razões de ordem técnica. Os pacientes dos outros clubes não correm riscos de enfarte porque cresceram a ver os respectivos clubes a perder.
Olha o 17 foi agora escarrar ao lavatório da enfermaria. Está tudo perdido. Deixa lá que eu à noite desligo-lhe o soro. Porco.
Fiz um ecocardiograma que parece indicar que tudo está normal em queluz ocidental. Amanhã, para acabar de vez com as dúvidas, fazem-me um cateterismo: Cateter pia cima com contraste e tudo:
"A doutora vai-me enfiar o quê, da virilha até onde ?"
Hásdem hásdem

Dia IV - C

Já me fizeram umas análises e um ECG mas não de esforço. Ainda nada sei do que se vai passar. Já vi locais com mais stress que este.

A minha sogra está no quarto ao lado, a dar almoço ao meu sogro. Depois de trinta anos acho que é a primeira vez que ela lhe está a dar comidinha à boca. Não prevejo nada de bom:
- Isto não te faz lembrar os bons velhos tempos ?
- Só se for a parte de não estar na posse de todas as minhas faculdades.

Acho que vou ali almoçar a uma brasserie que fica aqui nas redondezas e já volto.

Dia IV - B

O liquido que desinfecta as mãos é altamente inflamável. Não passa de hoje umas chóriças assadas na arrastadeira. Lá mais para a ceia. Se arranjássemos um caldo verde. Nem é preciso um daqueles abanos para atear o carvão que o da 22 está com um aparelho de oxigénio de alto débito.

Dia IV - A

Toalha e pijama lavados, rumo ao duche, logo cedo pela manhã antes que os de locomoção tipo 2 (muletas e cadeiras de coras) e tipo 3(cadeira de rodas com sanita incorporada, para poderem bombardear a meio do duche) lá cheguem e transformem aquilo numa espécie de jogos sem fronteiras. Pasta e escova de dentes no bolso do pijama. Tiro o pijama e quando olho para o cubículo do duche deparo-me com um cagalhão mesmo no meio do recinto. Saio dali a correr para chamar um auxiliar de limpeza.
- Ò senhor andré não pode andar nessas figuras pela enfermaria
- Ó mulher não me irrite, que eu não posso ser contrariado, está um cócó no meio do duche
- Eu vou lá consigo.
A auxiliar de copa vai comigo até lá e diz as palavras sábias:
- Confirma-se é um cagalhão. Ó Judite vai limpar os balneários que alguém evacuou no duche. Já pode ir para lá senhor André.

segunda-feira, fevereiro 02, 2009

Ponto de situação

Dezanove - hoje parece sossegadinho. Desde a discussão com o antigo 20 que está mais calmo. Deve achar que ganhou o campeonato por falta de comparência do ex parceiro.
Vinte - "Tenho cocó muito ralinho, o melhor é dormir com a arrastadeira aqui mesmo ao lado, porque entre a vontade e o evento vão no máximo 20 segundos" Parece que convenceu a enfermeira, lá está uma cadeira ao lado da cama e em cima da cadeira, a arrastadeira. Chato isto de sofrer de evacuação precoce.
Vinte e um - de vez em quando geme, de quando em vez grita, outras vezes dá-me recados para eu dizer às enfermeiras, mas fora isso é caladinho. Enche um urinol a cada duas horas.
Vinte e dois - está ligado ao oxigénio, e a uma máquina que dá números e que por vezes liberta uns excessos de pressão. Receio que com tanto ar o homem comece a levitar. Mas é o mais civilizado aqui desta zona.
Vinte e três - está sempre a querer ficar deitado e quase não fala a não ser para se queixar de dores. Parece ser o caso mais grave desta sala logo a seguir ao meu claro. Não percebo porque lhe põem fralda, nunca acerta na lindor.
Vinte e quatro - sou eu. Pedi uma arrastadeira para me disfarçar de D. Quixote hoje na festa do merdelim. Não me levam a sério.

Vizinhança

Olha o meu sogro foi transferido para a enfermaria ao lado da minha. Num repente a minha dor no peito agravou-se. Vou ter um enfartezinho, já volto

Dia III B

Substituição
A cama 20 já tem um novo inquilino. Num sítio destes, um número 20, há-de ser como no Benfica ou como na Selecção, aposto que vem aí um Simão Sabrosa, ou um Deco. Nada disto, esta enfermaria sofre de dirigismo benfiquista. Sai um atleta apto que até ía de cadeira de rodas à casa de banho, entra um outro que já tem a arrastadeira ali mesmo ao lado.
Mais um para o festival do merdelim das duas da manhã. Esta enfermaria a essa hora transforma-se numa espécie de Pitões da Junias: um local lindo mas cheio de bosta por todo o lado. Só ainda não descobri quem é o boi comunitário (Pitões das Junias pertence a uma região de trás os montes onde cada aldeia tem um boi que é preparado para as famosas chegas de bois).
Hoje à noite, para alegrar a festa, vamos encher luvas de cirurgião com o oxigéneo que está nas cabeceiras. Vai ficar lindo.

Dia III

O da 20 vai ter alta, o que é uma chatice porque era o que criava mais conflitos.

Então e eu camandro que ainda não me fizeram nada? Está com ar de que vou ficar a marinar por aqui durante uns tempos.

O meu sogro que está dois pisos abaixo de mim, na cardio vascular, está cada vez mais confuso. Cada vez que o vou visitar, desata aos gritos:
"Milagre, Milagre
O André resuscitou
Ossana nas alturas"

A corrida de arrastadeiras foi um sucesso. Na classe "motor a um tempo" ganhou o perneta da 112 e na classe a dois tempos ganhei eu com duas macas e meia de avanço sobre o segundo.