Luísa
(continuação)
Sentou-se na esplanada e abriu a revista enquanto esperava que a atendessem. Que raios, também nunca falta, e não lhe pareceu despropositada aquela pequena mentirinha no emprego. Uma mulher nem sempre se sente bem e as indisposições acontecem.
Hé tanto tempo que não ía aquela esplanada. Sendo das que mais gostava, nunca se lembrava que existia, nas alturas de decidir para onde ir. Uma varanda tranquila sobre o imenso oceano. A merecida paz, um abrigo. Além dela, só um casal de estrangeiros, a apanhar sol e a beber Cola com gelo e limão.
Os primeiros dias de Maio trouxeram-lhe o conforto adiado pelas chuvas de Abril. Que mês mais estúpido e frio. O calor fez-se finalmente sentir, sinal do sol a perder vergonhas.
Naquela manhã, acordou tarde, ganhou coragem e atirou-se ás mais longínquas zonas do roupeiro. Lá encontrou alguma roupa ajustada ás previsões do boletim meteorológico. Camisola de alsas e saia curta, o corpo todo ainda por dourar, mas que se lixe. Sempre mostra a tatuagem do ombro, que passa os invernos subterrada em agasalhos. Telefonou para o emprego e fez-se a um dia de descontração.
O empregado lá acabou por aparecer, registou o pedido e dirigiu-se para dentro.
Deixou-se levar pelas páginas da revista e irritou-se quando leu o signo. "No trabalho é chegado o tempo de se empenhar a sério". Olha que grande parvoíce.
Foi interrompida pela chegada do pequeno almoço. Sumo de laranja natural e um enorme pão de deus com queijo.
"Dá-me licença que me sente consigo ?" Perguntou o empregado.
Ia cuspindo o sumo de laranja. Olhou para ele e reconheceu aquela cara de algum lado.
"Desculpe?"
O empregado pousa mais um copo de sumo de laranja e um pastel de nata queimado. Esclarece-a:
"Pergunto-lhe se me posso sentar e tomar o pequeno almoço consigo."
Ainda surpresa acabou por lhe dizer que sim. Pareceu-lhe divertido.
"Não me importo, estava aqui a ler uma revista. Conversar também me parece bem. Diga-me lá, e se o seu chefe o apanha aqui ?"
"Estava a pensar em despedir-me. Pagam mal e fica muito longe de casa. Não vale o esforço de cá chegar todos os dias. Espero que ele apareça. Aproveito e comunico-lhe a minha decisão."
"Não se lembra de mim ?" Acrescentou.
Parecia-lhe tão ridículo estar ali sentada com um rapaz vestido de camisa branca, colete e laço preto, que nem se tentou lembrar donde o conhecia.
"Não estou bem a ver."
"Arranjei-lhe uma couve flor, uma vez na praça. Comprou legumes à minha mãe. Até se ía embora sem levar a couve flor."
Então era daí que o conhecia. O rapaz sedutor barato de olhar traquina, pois claro.
O senhor estrangeiro pediu a conta e ficou estupefacto quando ele lhe disse que já não trabalhava ali e que por ele, se podiam ir embora sem pagar.
"Ainda vai arranjar problemas com esta brincadeira, não quer retomar o emprego e tratar da conta dos senhores ?"
"Não se preocupe. Quero é tomar o pequeno almoço consigo."
E deixou-se ficar.
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