quinta-feira, fevereiro 16, 2006

Feira (continuação)

Por motivos óbvios, resultado de um planeamento rigoroso, há uma pessoa da família que sabe exactamente o que quer fazer e onde se deve dirigir: a todas as bancas sem excepção vasculhar tudo. Eu e os Marias andamos aos ziguezagues estimulados por guinchos que anunciam maravilhas a poucos aéreos. Mais um encanto daquele local. A unidade monetária. A unidade monetária de qualquer feira é o aéreo. É em quase tudo semelhante ao Euro mas só vai até cinco. Nada na feira custa mais que cinco aéreos, e se se encontra alguma coisa mais cara que cinco aéreos, deve ser motivo para desconfiar. Cada vez que ponho os olhos nalguma destas maravilhas de poucos aéreos, perco a atenção sobre os restantes elementos da expedição. E o mais ridículo é que sei que me vou perder da guia, e vou deixar fugir os Marias todos. Tenho um vendedor à frente que me demonstra que aquele maço de peugos foi feito exclusivamente  a pensar em mim, e eu, em vez de lhe dar atenção, estou a pensar “Não devia ter feito isto. Quero lá saber dos peúgos. Já não sei dos meus filhos e da minha mulher. Vou morrer aqui isolado. Onde é que eles  se meteram? Estou a ficar mal disposto.” O homem pergunta-me quantos maços de peúgos quero levar. Desato aos berros “Annnnnnaaaa. Joããããããõoooooo Maaannnneeeelllll”. Acabo por levar dois maços de peúgos de várias cores que nunca irei usar. Talvez os vermelho-sangue-de-boi tenham algum uso. Ainda não os encontro. Ir à feira é como ir para à Caparica em Julho. É preciso atar-nos uns aos outros ou usar pulseiras electrónicas.
Como é que eu vou encontrar a Ana e os meninos? Não que a Ana seja baixa, mas a maior parte das pessoas que frequentam as feiras é em média 20 cm’s mais altas. Este facto dificulta a pesquisa. Acabo por a encontrar porque me acena com três sweat-shirts iguais, imitação de GAP para os meninos que em São Martinho, em Agosto,  nunca têm nada para o frio da noite quando vamos até à vila. Dada a perigosa proximidade de Agosto e a manifesta carência dos meninos, concordo com a ideia. Ai que saudades. As idas à noite à rua direita de São Martinho do Porto em Agosto. A confusão é tanta que me lembram as idas à Feira de São Pedro de Sintra.
Reunido novamente o grupo, já a cesta vai cheia e os miúdos têm muitos brinquedos com uma esperança de vida média inferior a três horas. Tomo a dianteira da expedição e em dois raids compro uns DVD’s a poucos aéreos e mais um porta-chaves com lanterna e alicate e chave de parafusos e mais importante que tudo, com abre cápsulas. Desconfiei que havia algo de errado com os DVD’s porque a senhora que os vendia, tinha-os  escondidos dentro do soutien e, para escolher os filmes desejados, praticamente era preciso enfiar a cabeça dentro da camisola dela. Éramos alguns dez a olhar para a invulgar montra de DVD’s. Atrapalhado, mas com um ar triunfante, acabei por trazer os primeiros que me vieram parar às mãos.
Por fim, todos nós temos as compras feitas e regressamos a casa satisfeitos. A manhã na Feira de São Pedro acabou às seis da tarde numa fila de quilómetros para regressar ao lar.
Hoje somos todos mais felizes. Os meninos têm o que vestir nas noites frias de Agosto em São Martinho, o António tem uns sapatos novos para deitar sanita abaixo, a Ana tem umas pantufas e um saco de água quente novos e eu tenho dez pares de meias às cores e DVD’s sem nada gravado mas que têm as capas do King Kong, do Munich e do Crime do Padre Amaro. Se alguém lá em casa quiser ver algum daqueles filmes respondo que o leitor de DVD’s está estragado. Restava-me o consolo do porta-chaves com abre cápsulas. Hoje ao tentar abrir a carica da garrafa de leite de chocolate da UCAL, parti-o. Que falta de jeito.
Adoro a Feira de São Pedro de Sintra. Pena é que só exista no segundo e no quarto Domingo de cada mês. Seria uma angústia no primeiro e no terceiro, não fosse a feira de Cascais.

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