domingo, fevereiro 27, 2005
Duas Irmãs
Encontrei-as assim na Lisboa já velha. Duas janelas que nada reflectem, viradas para lado nenhum, costas para o rio. Uma ausente, morta, camuflada na degradada parede, envergonhada e entregue à sorte. A outra de luz fraca, a recortar a roupa de Sábado à noite...
As mesmas desculpas de sempre para aquelas saídas. Que é só um copo para acompanhar a bola com os amigos. Já sabe tudo de cor sobre os Sábados. Já lhe conhece o final. Sabe que o banho da tardinha e a camisa pendurada com cuidado o levam muito para lá da tasca do Alfredo. Depois é a barba acabada de fazer e aquele cheiro a Old Spice que a faz vomitar. Evitou a despedida e assim que ele foi para o banho, avisou-o das dores de cabeça e abrigou-se no quarto. Fechou as portadas, deitou-se e ficou para ali a ouvi-lo cantarolar baboseiras. Só queria adormecer e acordar no dia seguinte. Pode até acontecer, se a noite lhe oferecer um corpo de abrigo, senão são os copos sempre a mais, o regresso casa feito de gestos bruscos, o bater da porta, os gritos, os insultos que lhe rasgam a alma, o amor à bruta que lhe rasga o corpo, a porrada e o cheiro a vinho. Ainda o ouviu sair e acabou por adormecer. Acordou sobressaltada com o estrondo da porta.
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