terça-feira, outubro 04, 2005

Teatro

Aviso aos leitores: este é um post muito reaccionário.
Tema: A crise das companhias teatrais (essencialmente no Norte) por atrasos no processo de distribuição de subsídios por parte do ministério da cultura.

Este atraso na distribuição de verbas já cabimentadas tem vindo a provocar a suspensão ou cessação de actividade de algumas companhias de teatro nortenhas. De um modo genérico, o teatro em todo o país sofre de uma exagerada subsídio dependência. Não me parece que faça sentido que uma actividade esteja sobredimensionada para o mercado que tem, esperando a existência de subsídios para garantir a sobrevivência. A dura realidade é que não há público suficiente para tanta companhia de teatro e que, à semelhança do que se passa noutros mercados, a oferta vai ter que se dimensionar à procura. Isto implica necessariamente o desaparecimento de muitas destas companhias. As mercearias de bairro fecham, os cinemas de bairro fecham, as indústrias pouco competitivas fecham, as escolas sem alunos fecham, os clubes de vídeo fecham e as galerias de arte também. Porque estão no meio de lutas desiguais mas sobretudo porque não têm mercado e porque o que existe procura soluções mais económicas. Isto quer dizer que eu acho que o estado não deva subsidiar o teatro? Não. Acho que o deve fazer de forma a não criar relações de subsídio dependência.

Formam-se comissões independentes que avaliam os projectos e decidem quais as companhias a financiar. Isto é não é nada. Quem é que garante que uma comissão independente faz uma triagem válida, face ao público que vai, ou está disposto a ir, ao teatro. Para mim, fazia sentido que o estado comparticipasse ou financiasse as acções de divulgação das peças que as companhias colocam em cena, e que pagassem em função do número de espectadores que tivessem ou directamente aos espectadores que comprassem bilhetes para as peças. Seguramente a ida de escolas ao teatro deveria ser totalmente paga pelo estado para garantir a vertente educacional e criar de uma vez por todas os bons hábitos. Virtude desta ideia: a triagem é feita pelo público. Defeitos desta ideia: corre-se o risco de premiar a falta de qualidade, a ausência de conteúdos culturais e educativos, a versão pimba do teatro. Existiriam casos destes como existiria o contrário, ganhar-se-ia a garantia que só se financiavam projectos com aceitação do público. Não acredito no financiamento de Brancas de Neve. Problema da ideia: as companhias deixavam de ter capital à cabeça. Solução para o problema: teriam que procurar investidores ou recorriam a crédito bancário com taxas de juro bonificadas. E se o projecto corresse mal ? Se corresse mal, acontecia o mesmo que acontece a todas as pessoas que têm ideias brilhantes mas que não resultam, e que se vêm a braços com a necessidade de pagar um empréstimo que contraíram para as colocar na prática. O risco só pode estar do lado de quem quer levar a sua avante. É natural e desejável que assim seja.

O país está cheio de pessoas que não estão a fazer aquilo para o qual investiram toda a sua formação. Os actores, encenadores, figurinistas, técnicos de luz e técnicos de som não têm que estar imunes à crise que o país atravessa. A verdade é que face a uma crise financeira, uma família começa por cortar naquilo que é considerado actividade de recreio. É triste ? É duro ? Pois é. Mas é nessa área que as pessoas do teatro resolveram trabalhar. Não têm outra alternativa ? Deviam ter. Eu gosto muito de escrever e tenho paixão por cantar. Gostava muito de cantar. Pois claro que gostava (mas também acho que o mundo não tinha obrigação de me aturar as cantorias). Não tive coragem para viver da minha paixão ? Pois não tive, e admiro muito quem teve. Mas as escolhas pessoais são sobretudo isso. Pessoais. Quando se escolhe sabe-se o que é que se está a escolher e os riscos que se estão a correr.

Uma companhia de teatro só deve existir, se conseguir levar pessoas às suas peças e se conseguir gerar receitas que permitam suportar os custos que têm. Podem e devem, face à actividade que exercem, ser apoiadas. Nunca sustentadas. Confesso que me irrita ouvir dizer que o estado não está a cumprir com as suas obrigações quando estamos a falar de um apoio que devia ser encarado como uma ajudam, e é transformado no principal suporte do exercício da actividade.

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