sexta-feira, setembro 16, 2005

Lisboa


Cada passeio é uma peça de arte, obra de calceteiros. Na minha cidade há recantos de fontes e chafarizes, há escadas e corrimões, há eléctricos e elevadores. Quem nela vive ainda encontra quem distribua leite, quem vende língua da sogra em semáforos, quem venda castanhas e gelados, quem mande na chuva e se faça anunciar em melodias num instrumento de sopro. A minha cidade tem jazz, tem fado, tem rock e tem pop. Tem acordeões e violinos. Quem nela vive sabe onde a cidade entrega ao rio, sabe onde se namora e onde se vêm as vizinhas na cusquice. Sabe como é que se apanha e se salta de um eléctrico em andamento. Consigo mostrá-la por inteiro dos locais que me ensinaram. A minha cidade são todas as aldeias juntas, sei de portas e janelas abertas para a rua, sei o nome das pessoas, sei onde moram os artistas, onde se pede esmola, onde se acena a quem passa e onde se encontram os velhos amigos. A minha cidade é a cidade da Maluda, do Carlos, do Vasco e da Beatriz, do Eugénio, do Cassiano, do Sérgio, do Fernando, da Teresa e de muitos outros. E de todos nós. A minha cidade é cheia de luz e sombras e cheira bem.
Os senhores que ontem à noite deram, na televisão, aquele triste espectáculo não são Lisboa. São parvos.

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