segunda-feira, julho 11, 2005

A Florinda

... é um daqueles personagens que existe em Lisboa. Deve ter uns 60 anos mas aparenta ter 70, resultado de uma vida, que imagino, levada a pulso.
É porteira de todos os prédios da rua. Põe o lixo e lava as escadas de quase todos e sabe a vida de toda a gente. Tem um orgulho imenso nos filhos, e quando o carro do INEM por lá pára, não se cansa de repetir que é o carro do trabalho do filho.
A primeira vez que fui à mercearia lá da rua, ainda nem morava lá, apresentou-me à mulher do merceeiro e disse coisas que nem eu sabia sobre a minha vida. Sabia para que número e andar eu ia viver, o nome dos antigos donos, quantos filhos eu tinha, com quem eu era casado e provavelmente quanto dinheiro dei pela casa. Os Marias adoram-na e correm para ela sempre que a vêem, excepção para o mais novo que não corre para ninguém a contas com a tenra idade. Quando os vê lá se põe aos gritos do meio da rua "Olha o meu Manel. Olá Manel." "Olha o Zé. Olá Zé." Chama sempre Zé ao João à conta de um Zé Maria que era filho dos antigos donos da minha casa. Além de trocar o nome ao João, também troca os olhos. Tem os olhos linearmente independentes e um deles parece ter vida própria. Não me chateia nada, a não ser o facto de nunca saber se está a falar comigo se com o Jesus que anda sempre por perto. Não por ser omnipresente, antes por ser o arrumador de carros lá da rua. Anda de muletas e bebe para lá da conta. Depois do meio dia deixa de ser seguro entregar-lhe as chaves para ele arrumar o carro. Mas se deixar o carro em 2ª fila e se aparecer o dono do carro que tapei, a polícia, ou um lugar vago em primeira fila, o Jesus trata de tocar à campaínha para nos avisar. Ainda bem que o nome dele não é Judas. O que não seria em despesas de reboque e em multas.
Cada um deles é mais cusco que o outro, sabem a vida de toda a gente, e no fim do dia actualizam-se mutuamente com as últimas novidades. Este post é precisamente para eles não interpretarem mal as minhas idas à sex-shop.
Acontece que às horas a que chego a casa, a sex-shop é o local mais perto para comprar tabaco. E sinceramente não estou para ir até ao outro lado da rua só porque posso ser apanhado a sair da sex shop com o António ao colo. Ele tem sete meses e aquilo que por lá vê, é muito parecido com aquelas torres para enfiar argolas às cores. Aposto que ele nem consegue destinguir uma coisa da outra. Juro que com os outros dois nunca vou lá comprar tabaco nem nadica de nada. Tá bem Florinda? Tá bem Jesus?
Pronto. Estou muito mais descansado. Foi um peso que me saiu das costas.

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