Tomara que vejas o que fizeste, tomara que ao olhar saibas ver, porque o que está à tua frente não são sinais de cansaço, são dores, são dramas, desesperos, são sacrifícios mas sobretudo são a certeza de serem em vão, estéreis que não dão fruto. Foi esse sentimento que levou à rua todas as indignações, tantos sonhos destruídos, tamanha revolta e outro tanto de solidariedade. Foi isso que encheu as ruas de mágoa. A certeza de não haver proveito em tamanho dano. Não foi outro 25 de Abril. Nem nunca será. Na altura, foram anos de silêncios forçados, que explodiram em euforia e esperança. Hoje não há nenhuma razão para euforia e a esperança perdeu-se quando comunicaste a intenção de nos fazer seguir o caminho que mais nos fere na dignidade sem que nos leve a lugar nenhum. Temo que tenhas perdido a credibilidade, reconhecem-te o miserável mérito da firmeza e da teimosia. Em contraciclo, outros terás que nem sabias. O de reunir, como um jogo de futebol, tanta gente tão diferente. O de levar, como uma vitória no campeonato do mundo, muitos pela primeira vez à rua. O de pôr tantos a indignar-se pelos filhos sem futuro, pelos amigos desempregados, ou simplesmente pelo desespero dos outros, como um mau governante. Fica-te pois o mérito de nos fazer a olhar em volta e de sair da confortável órbitra dos nossos umbigos. Desta vez, as espingardas não ganharam flores nas pontas dos canos. Desta vez um polícia. Só um polícia ganhou um abraço, mas Portugal ganhou novamente o orgulho de um povo unido. Tomara que o saibas ver, porque “o essencial é invisível aos olhos”.
(Foto de: Jose Manuel Ribeiro/Reuters)
1 comentário:
Para finalmente te dizer quanto aplaudo a forma e talvez mais o conteúdo.
Disseste a vida, o sonho, a utopia que sempre nos faz dar um salto mais além
Agradeço-te muito estas postagem e o grito na rua de tantos e de tantas, que sem cálculo saíram e com todos comungaram a dor.
Mãe
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