É o cabelo. É aquela gadelha imoral, que lhe retira mais que uma década ao que consta no bilhete de identidade. E as horas de ginásio caramba. A mise-en-scène, parecendo que não, também ajuda. Isso mesmo, os adereços de adolescente, compõem o ramalhete. É pá mas o cabelo, aquela farta cabeleira, ninguém me convence que não é o cabelo. E o tipo não stressa com nada !!! Vive tudo como se nada fosse. Ele vive numa eterna adolescência, e isso conta. E a quantidade de comprimidos que ele toma. Só vitaminas são mais que as letras do abecedário, e os cremes e os revitalizantes e os energéticos. É tudo isso. Mas o cabelo, caramba. Não fosse o filho da puta daquele cabelo.
Dissertávamos sobre o elixir da eterna juventude de um Sansão grisalho, e por pouco não tropeçámos nas banalidades do que o que conta é a idade de espírito, e que o bilhete de identidade nada determina. Resvalou a conversa para zonas menos óbvias e mais interessantes. Afinal quando nos apercebemos que estamos velhos ? Haverá uma idade a partir da qual é óbvio ?
Mas se hoje em dia, homens e mulheres mais que feitos, sentimos o mesmo de há vinte anos atrás, recém saídos de adolescências animadas, será que daqui a vinte anos a sensação vai ser a mesma? A julgar pelo eterno adolescente grisalho gadelhudo, não há-de ser grande a diferença.
Não é possível. Alguma vez daremos por ela. Alguma vez havemos de dizer: estou velho.
A velhice não parece ser fácil de detectar. Não se chega lá por auto-exame. Li uma vez que o que mais custa no envelhecimento é perder um gesto todos os dias. Como se em cada dia, nos despedíssemos de um gesto, que não mais conseguiremos fazer. Como atar os cordões do sapato, ou subir degraus de dois em dois, ou saltar um obstáculo. Mas há-de haver algo mais. Talvez o gesto do sonho e do futuro. Poderão ser esses os limites? Se calhar é isso mesmo. Estar velho é despedir-nos de um gesto maior. Como o de nos preocuparmos com o futuro. Estar velhos é esquecer-mo-nos de sonhar.
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