Lisboa, essa imensa aldeia, capaz de transformar a vida de cada cidadão numa experiência única. Além das hortas entre vias rápidas, e para lá das fronteiras dos bairros típicos, a vida de aldeia manifesta-se em cada lugar da velha cidade. A minha não é excepção. O arrumador de carros chama-se Jesus, o que dá jeito, porque encontrar um lugar para estacionar nas redondezas é um verdadeiro milagre. Além de jeito, dá umas aulas de catequese particularmente animadas, sobretudo enquanto a catequista não descobre que estão a falar de Jesuses diferentes:
- Como arruma carros e abusa um bocadinho da pinga? Jesus foi crucificado e resuscitou ao terceiro dia ...
- Ah pois resuscitou resuscitou, porque ainda hoje me deu os parabéns e na Sexta Feira o meu pai lhe deu uma moeda de um euro. Lá se ele foi essa coisa que se diz, não faço ideia.
Além do Jesus, existe uma senhora que é a porteira da maioria dos prédios, que sabe a vida da rua toda e consegue ter um olho apontado a Arroios e o outro à Alameda. Olha-me de lado (na realidade acho que olha a todos à conta dos olhos linearmente independentes) desde que me viu entrar na sex-shop com o António ao colo, tinha o petiz uns três meses. Foi para comprar tabaco, mas isso ela não sabe. Para todos os efeitos eu levei um quase recém nascido a uma sex shop e isso não é bom. Desde esse dia que sou apontado e comentado em sussurro sempre que saio à rua. Sobre tudo isto parece-me que já falei aqui no blog, acontece que o guarda nocturno acabou de aparecer na SIC a cantar na gala da família superstar. E foi cantar esta pérola que nunca tinha ouvido, para grande pena minha. Como é que um ser humano atinge um desconto de 40% nas armações da multiópticas sem conhecer este icon da música de expressão portuguesa?
Garçon
Garçom, aqui, nesta mesa de bar
Você já cansou de escutar
Centenas de casos de amor
Garçom, no bar todo mundo é igual
Meu caso é mais um, é banal
Mas preste atenção por favor
Saiba que o meu grande amor
Hoje vai se casar
E mandou uma carta pra me avisar
Deixou em pedaços o meu coração
E pra matar a tristeza só mesa de bar
Quero tomar todas, vou me embriagar
Se eu pegar no sono, me deite no chão
Garçom, eu sei, eu tô enchendo o saco
Mas todo bebum fica chato
Valente, e tem toda a razão
Garçom, mas eu só quero chorar
Eu vou minha conta pagar
Por isso eu lhe peço atenção
Saiba que o meu grande amor
Hoje vai se casar
E mandou uma carta pra me avisar
Deixou em pedaços o meu coração
E pra matar a tristeza só mesa de bar
Quero tomar todas, vou me embriagar
Se eu pegar no sono, me deite no chão
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