Nas férias, além de me transportar para outro local, transporto-me para outras rotinas. Pomposamente chamam-lhe “mudança de ares”. Servem para muscular os sentidos, habituá-los a novos estímulos ou rever velhos conhecidos. Reencontro outros sabores, odores, sons, texturas, luzes cores e formas. Às vezes apanham-me em falso, outras vezes coincidem com um padrão há tanto tempo gravado na memória. A memória olfactiva é a que mais me surpreende. Num café, lembrei-me de cada detalhe do cheiro da casa do Carlos, meu amigo durante a preparatória.
O próprio conhecimento muda de rotina. De ares portanto. Se hoje não sei quando é a “praia mar e a baixa mar”, há uns dias sabia. Era importante para os levar aos caranguejos com os novos camaroeiros. Se são camaroeiros, porque é que não os levava aos camarões ? Não sei a resposta para esta pergunta.
Viajei de combóio até ao Algarve. Passar a ponte, ter tempo para leituras e para as conversas dos outros. Não ia mal, de quando em vez, ir de transportes públicos trabalhar. Abre brechas para outros prazeres.
Fiz um escândalo no McDonalds, não me orgulho nem me arrependo, mas fui felicitado pelos meus momentâneos parceiros de fila. Hei-de escrever os detalhes.
Durante estes tempos, sempre a mesma aflição. Preciso de um bloco de notas para apontar isto. Uma frase, uma memória, uma luz, uma outra frase, um riso ou uma irritação. Nunca andei com um bloco de notas e senti-lhe sempre a falta. Resta-me guardar o que quero na cabeça, mas nesta idade, torna-se difícil.
A propósito de idade, e isto é um aviso que eu espero prematuro:
O primeiro anormal que se lembrar de, num transporte público, se levantar para me oferecer o lugar sentado, leva com a bengala nos cornos.
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