terça-feira, março 09, 2010

Na sala

É engraçado entrar na sala e ver-vos a todos sentados em carteiras, primeiro ano com direito a carteira, tantas vezes maior que tu. Fico zonzo com o teu ar de felicidade extrema por nos teres lá a assistir à tua aula. Não te preocupes, é próprio da idade. Daqui a quarenta anos só a ideia de teres os pais a assistira a um dia de trabalho, vai deixar-te constrangido, a menos que o teu futuro passe pela carreira de funcionário da EMEL e, nesse caso, vais rezar para que não aconteça, porque levas com a bengala do pai e a algália da mãe nos cornos. Onde já se viu? A bloquear o carro aos senhores.
A parte da frente da carteira, tem um tampo, e debaixo do tampo, tem espaço para as pernas. Parece impossível que as tuas nunca lá estejam e andem, como a agulha de uma bússola estuporada, sempre longe do local criado para o efeito. Gostei tanto de ler na tua classe, de já saberes da letra t e de a colares ao contrário na folha de papel. No recreio, ia-me dando a tronglamongla de tanto rodopiar os teus amigos rumo ao infinito e mais além. Aquele jogo do pisca pisca, é um bocadinho panhonhas. Piscar o olho uns aos outros é panisgas. Hás-de pedir à Professora Emília para vos ensinar a jogar ao bate pé que é muito mais animado e confere horas intermináveis de gestão da autoestima.
Adorei assistir à tua aula, e ganhei um quadro de pirata lindo. Agora já quase sabes ler, e finalmente a taxa de analfabetismo lá de casa regressa a zero, após onze anos consecutivos de valores acima dos 20%. É verdade, quando souberes escrever, lá para Maio, evita fazer panfletos insultuosos aos teus irmãos, como o Manel fez aos cinco anos.

2 comentários:

Anónimo disse...

No meu tempo os pais não iam assistir ás aulas dos filhos. O que era uma pena pois em Dezembro já eu lia na perfeição e seria a minha oportunidade de brilhar.

Também não irei ler nas aulas dos filhos que nunca terei mas espero ter a oportunidade de fazê-lo na aula da minha sobrinha pois ao ler o teu texto deu-me uma vontade enorme de correr para a escola dela, invadir a aula e sentar-me direitinha na carteira (sim, a minha altura permite-me fazê-lo)

Parabéns pelo texto. O mesmo já foi lido em voz alta aos meus colegas do lado.

Bjs

Marlene

Anónimo disse...

Só não percebo a futurologia.

Daqui a quarenta anos

«pai de bengala»
«a algália da mãe»


Tenho uma longínqua explicação.
Aos três anos eu olhava para a minha mãe e achava-a REALMENTE TÃO VELHA.
Hoje, «a minha mãe foi SEMPRE TÂO, MAS TÂO NOVA»

T frazao